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Revista Luz & Cena
entrevista
Integrar e reinventar (Versão original - Parte 1)
Em entrevista exclusiva - cuja versão reduzida você encontra na AM&T 302 -, Louis Hernandez, Jr., presidente da Avid, fala sobre o que a empresa está fazendo para aproximar artistas e profissionais e permitir que a ponta criativa da indústria fonográfica volte a ser remunerada adequadamente
Enrico De Paoli
Publicado em 17/11/2016 - 20h21
AM&T
Louis Hernandez, Jr. - presidente e CEO da Avid (AM&T)
Louis Hernandez, Jr. - presidente e CEO da Avid
(Confira a Parte 2 da entrevista em http://musitec.com.br/noticias/?c=2603.)

Ser colunista desta revista há quase 20 anos, assinando o "editorial final" (como diria o nosso saudoso editor-chefe, fundador e amigo Sólon do Valle) mensalmente na última página desde o ano 2000, me proporcionou muitas coisas bacanas. A principal delas foi me botar para estudar os assuntos que eu desejava escrever a respeito, assim como educar a minha mente a estar sempre antenada para situações com potencial para "virar artigo".

Desta vez, fora da "minha" última página, o tema aqui não é livre. A nossa revista Áudio Música & Tecnologia me convidou a passar uma manhã conversando pessoalmente com o Sr. Louis Hernandez, Jr., presidente e CEO (Chief Exectuvie Officer) da Avid. A ideia inicial seria fazer uma entrevista com ele, sendo eu acompanhado pelo nosso editor Marcio Teixeira. O Marcio faria mais perguntas relacionadas ao mercado, e eu abordaria mais temas técnicos, musicais. Mas a entrevista rapidamente se transformou num longo bate-papo e eu compartilho com vocês aqui os momentos mais interessantes.

O encontro, que se deu no apartamento onde Hernandez estava hospedado durante as Olimpíadas no Rio de Janeiro, aconteceu após convite do próprio e de sua assessoria de imprensa. E com café espresso e bom humor começamos o bate-papo. Quando perguntei se ele se incomodava comigo gravando a conversa, ele prontamente me perguntou se deveria tirar a S6L da mala pra que eu a usasse (risos)... Mas como eu estava chegando de uma viagem de show na noite anterior, ainda sem dormir, eu preferi focar no café e na conversa.

"É curioso como na Copa do Mundo, há dois anos, todo mundo por aqui parecia muito preocupado com os preparativos para as Olimpíadas, e tudo está tão lindo... Antes de eu chegar no Brasil, recebia mensagens de texto de amigos e colegas de trabalho que já estavam aqui e diziam: 'o Rio é organizado, bonito, tudo muito seguro e funcional, os transportes maravilhosos etc. E, assim como na Copa do Mundo, o mundo inteiro só comenta como é maravilhoso. Acho que o governo, na verdade, faz isso de propósito pra causar essa surpresa ao mundo!'", observou Louis.

Desnecessário dizer que eu recebi tudo o que ele disse com muito orgulho e felicidade, e comentei que, de fato, existe uma pré-disposição do brasileiro a achar que tudo do governo dará errado (infelizmente, temos algumas razões para isso!), além do hábito de se deixar tudo para depois, acreditando que "no fim, tudo dará certo". Sem dúvidas, desenvolvemos talento para improvisos, talvez melhor do que em outros cantos do mundo, mas não podemos tirar o mérito dos povos e dos profissionais, dos governos e das empresas, que tanto se preparam para um determinado projeto. Com estudo, investimentos corretos e profissionais adequados e preparados. Na verdade, todo esse intercâmbio, desde as Olimpíadas à própria entrevista, sempre me mostra que estamos sempre aprendendo uns com os outros.

Enrico De Paoli: Louis, pode nos falar sobre o motivo de sua vinda ao Rio?

Louis Hernandez, Jr.: Estamos aqui por vários motivos. Primeiro, porque é o Rio! (risos) A América do Sul é um mercado enorme e muito importante para nós. Além disso, esporte é uma crescente área de atuação nossa. E temos muitos clientes aqui, assim como mundialmente, ligados nos esportes. Aqui estando o maior evento esportivo do planeta, eu não poderia deixar de estar fisicamente presente com a Avid mostrando o nosso suporte a algo que é importante para eles, nossos clientes.

Como a indústria está passando por grandes transformações, não apenas no áudio mas em tudo relacionado a mídia e tecnologia, achei pertinente estar junto dos nossos clientes durante estas transições. E alguns deles estão aqui nas Olimpíadas usando algumas das mais avançadas tecnologias atualmente. Se eu fosse citar três delas, eu começaria falando de "Avid Everywhere", que lançamos há três anos e meio. O Media Central, nosso sistema operacional por trás dos programas, cresceu 47% no último bimestre. Isso significa que a credibilidade nesse sistema aumentou brutalmente. E como ele interliga todos os aplicativos, fica tudo muito mais eficiente.

Nossas assinaturas de programas cresceram 400% em um ano, com destaque para os programas acessados na nuvem por usuários individuais de Pro Tools e Media Composer. O Pro Tools, devido à "colaboração em nuvem", que está sendo usada aqui nas Olimpíadas, é bastante responsável por este crescimento, conosco tentando navegar por esta dinâmica que está acontecendo na maneira de se trabalhar. A maioria das pessoas nos conhecem pela música. Alguns sabem sobre as nossas soluções para edição de imagem, mas a maioria se surpreende quando percebe a nossa atuação nos esportes, gráficos, realidade virtual, storage e arquivamentos etc. A Avid tem a habilidade de influenciar o processo completo, desde o momento da ideia de criar uma música até quando esta está sendo tocada para os ouvintes, e tudo entre estes dois momentos.

Se pararmos pra ver o que está sendo usado aqui nestas Olimpíadas, percebemos que toda esta tecnologia está aqui. Temos um contrato com a OBS [Olympic Broadcasting Services] e temos estado em todas as Olimpíadas com a NBC, desde Sydney, na Austrália, no ano 2000. Mas aqui também estamos com outras, como a TV coreana, a norte-americana NBC novamente, TVNZ, da Nova Zelândia, Shanghai e CCTV, da China, que também estão usando nossos sistemas, ZDF, da Alemanha, Televisa, do Mexico, e a TV Globo, uma das mais sofisticadas empresas de mídia do mundo. Vocês têm muita sorte de ter a Globo! Eles são famintos por informação e tecnologia. Eu viajo muito e lido com muitas empresas. Não importa onde vou, as questões se repetem em todas elas. As melhores estão se adaptando rapidamente às mudanças no mercado. E estamos usando todas essas novas tecnologias aqui com estas empresas, das edições no Media Central a ferramentas de publishing, de áudio, colaboração por nuvem compartilhada e integrada, armazenamento e segurança de dados, MAM [Media Asset Management], distribuição, reprodução... Temos tudo em uso aqui no Brasil: gráficos, realidade virtual aumentada etc.

Então, se você me perguntasse o que vejo de diferente neste momento em termos de tecnologia nestas Olimpíadas, eu diria: um - estamos fazendo muito mais com muito menos. A razão pela qual trabalhar em nuvem é tão importante neste evento é que as empresas querem ter acesso aos arquivos sem ter que enviar profissionais para cá. A NBC, por exemplo, que transmite para tantos lugares diferentes, está com, talvez, apenas um terço dos profissionais que costumava levar aos Jogos Olímpicos. Com acesso imediato aos arquivos na nuvem, eles podem ter os melhores profissionais do mundo trabalhando nas Olimpíadas sem que estes necessariamente estejam aqui. Dois - imersão. Ou seja, se você prestar atenção nas nossas ferramentas de realidade virtual aumentada em uso, elas permitem aos profissionais contarem suas histórias de uma forma muito mais atraente, literalmente puxando o espectador pra dentro delas. Três - Todos os experimentos em tecnologia 8K. Algumas empresas estão usando 4K, a maioria ainda em HD, mas a Globo, por exemplo, está rodando muitos arquivos em 8K. Não necessariamente os transmitindo todos em 8K, mas os processando, assim como faz a japonesa NHK, que também é uma grande parceira da Avid.

Então, acho que estas três menções se alinham com o que está acontecendo no mundo neste momento. Quando pergunto para os maiores executivos das empresas de transmissão do planeta o que eles desejam fazer, a resposta é sempre "contar a história da melhor forma possível". Pra isso, eles precisam das melhores ferramentas, dos melhores gráficos saltando pra fora da tela, e eu quero que o som salte junto. Queremos os esportes juntos com a realidade virtual aumentada etc.! Precisamos mostrar a história do jeito mais incrível, e queremos que esta história chegue em todos os canais, para todo mundo, e rápido. Queremos que os expectadores se envolvam. É isso. Ah, e precisamos gastar menos. Não queremos dizer "não gastar mais ainda". Precisamos, de fato, gastar menos dinheiro.

Pensando bem, isso é exatamente o que eu penso sobre mixar um show, ou mixar uma música em um disco. Queremos o melhor som possível para aquela música, e que o público se sinta dentro dela durante e após o término. Quanto a gastar menos no mercado da música, eu traduziria isso fazendo uma analogia com shows, pois hoje podemos viajar com muito menos equipamentos, ou com estúdios, uma vez que agora fazemos grandes produções dentro de um MacBook... No caso destas emissoras, elas podem viajar com muito menos equipamentos e, inclusive, como dito anteriormente, com muito menos gente.

Eu passei toda a minha carreira conectando as pessoas digitalmente. Fosse da área do comércio eletrônico ou dos bancos. E todas as indústrias sofrem um choque quanto mais digitalizada ou virtual for essa conexão. A mídia está passando pelo epicentro da transformação virtual, assim como os bancos e o comércio eletrônico em meados da década de 2000, e como aconteceu com a música no final dos anos 90, inicialmente com os erros de implantação, digitalização de arquivos originais e, consequentemente, problemas na monetização. Mas quando se trata de digitalizar relacionamento, temos a possibilidade de juntar as pessoas mais rapidamente. E, fazendo isso, você quebra o modus operandi e o fluxo financeiro. E com isso vem a crise.

Por exemplo, na indústria da música, hoje em dia, muito mais dinheiro é empregado em distribuição digital do que em criação. Então temos uma consequência não intencional, pois continuamos querendo e precisando dos melhores artistas e do melhor som, mas o dinheiro não está indo pra eles. A renda do artista despencou 40% em média nos últimos dez anos, enquanto o faturamento das empresas que produzem a tecnologia de streaming [distribuição digital em tempo real] subiu 280% somente no ano passado. Antes, para um artista ganhar US$ 1.000, ele tinha que vender 400 ou 500 CDs, dependendo do preço do CD.

Para ganhar estes mesmos US$ 1.000, ele passou a precisar vender de 5 mil a 6 mil downloads no iTunes, custando entre 99 cents e 1,29 dólares cada. E, agora, para ter este mesmo faturamento exatamente, um artista precisa conseguir ser ouvido por streaming de um milhão a quatro milhões de vezes, dependendo do provedor. Então, essa virtualização do mercado causa, inevitavelmente, um desequilíbrio não planejado.

No caso dos bancos, os pequenos sofreram muito quando os grandes passaram a ter um relacionamento eficaz digitalizado. Normalmente, as empresas pequenas tendem a sofrer mais de uma maneira geral. Em áudio [e música], é muito claro que a consequência não planejada é o dinheiro estar indo para quem distribui a música online, e não para onde a mágica, de fato, está. E é aí onde nós, a Avid, estamos tentando virar o jogo. Talvez de forma não tão extrema quanto no áudio e música, mas as empresas de mídia também estão vivenciando essa transição. E as bem-sucedidas não estão paradas, esperando se tornarem vítimas dessa mudança. Em vez disso, estão se antecipando aos novos hábitos e ao novo mercado.

A americana ESPN acabou de passar por grandes mudanças internas, mesmo sendo uma das maiores empresas de mídia esportiva do planeta. A também americana Fox acabou de antecipar aposentadorias em 10% de sua folha de funcionários. Na AlJazeera, do Catar, e em sua subsidiária BeIN Sports, a mesma coisa. A própria Disney também. E a Globo, que está sob uma boa pressão de eficiência de custos. Por que eu mencionei estas cinco? Porque elas são as maiores do mundo. E mesmo sendo as maiores e não estando passando aperto algum neste momento, elas desejam continuar na liderança. Por isso a antecipação aos fatos. Google, Netflix, Amazon Studios... 90% do material deles é produzido usando Avid. Por acaso, nosso mercado de streaming ainda é maior do que a nossa atuação em transmissões.

Veja o crescimento da Netflix! Eles estão se preparando para fazer cinco grandes produções este ano, e estão brigando agressivamente contra as grandes televisões do mundo. E estas, por sua vez, não têm nenhuma intenção de perder essa batalha. A Globo, por exemplo, gigante, com dirigentes e profissionais ultraqualificados, conhecem o mercado como ninguém, e definitivamente estão se ajustando para todas estas mudanças, de forma que eles possam competir melhor e melhor, com ambas as frentes.

Então, chegamos de volta ao assunto do porquê de estarmos aqui no Rio de Janeiro neste momento: de longe, o maior evento esportivo do mundo neste ano. Importante legado ao mercado de broadcast. E, assim como na música, "ao vivo" é onde está o maior faturamento. Noticiário ao vivo, esportes ao vivo... Aliás, este é um dos motivos pelos quais os direitos das transmissões de esportes são tão caros hoje em dia. E aí novamente entramos nós: como podemos ajudar nossos clientes a terem retorno desse investimento brutal.

Avid MediaCentral: criação, gerenciamento e distribuição de conteúdo - tudo na mesma plataforma

E, na sua opinião, por que é no "ao vivo" que está o dinheiro?

Bem, nos anos 90 eu estava trabalhando com digitalização de catálogo para a internet e então percebi que a curva de rendimentos no mercado de música era infinitamente maior para os artistas comercializados pelas gravadoras. Ou seja, nós todos ouvíamos o que as gravadoras e selos queriam que ouvíssemos. Então eu pensei... 'se nós pudermos digitalizar todo o resto das músicas, poderemos ouvir toda essa maravilha de música desconhecida que não é controlada pelas gravdoras! As pessoas ouvirão o que querem, e não o que é imposto, e a curva de rendimentos será mais plana'. Mas o que aconteceu não foi bem isso.

Como as ferramentas de digitalização e gravação se tornaram muito acessíveis, passamos a ter material demais. São 40 milhões de músicas novas gravadas todo ano! Então, a menos que você tenha todo o tempo do mundo para ouvir tanta música nova, você naturalmente precisa de algum tipo de filtragem. Adivinhem quem é o filtro? Quem a Universal Music acha que são os melhores artistas? Ou... quais são os Top Ten?

Ou seja, a cauda da curva ficou tão longa, com tanta música e artistas existentes, que a curva de rendimentos, em vez de ficar mais plana, ficou mais acentuada ainda. Hoje, 70% do faturamento pertence a menos de 1% dos artistas. Hoje, mais do que nunca, é difícil "acontecer" no mercado. Ou você está dentro, ou você não ganha nada. E é bem difícil estar dentro. E se você está fora, talvez você tenha que trabalhar para a Avid! (risos). E qual artista quer isso, se ele nasceu pra ser artista? Quando você toca ao vivo, o faturamento não tem que vir dos streams filtrados [execução pública digital online], mas sim da bilheteria. Por isso o "ao vivo" dá mais dinheiro.

Em broadcast, qualquer coisa ao vivo não pode ser replicada, então vale muito mais, como notícias ou esportes locais. Em música, as pessoas adoram ir a show porque eles são únicos. Acontece ali, naquele momento, e somente alí. Se você já "aconteceu" como músico ou artista, é nos shows que você vai ganhar mais. Se você ainda não aconteceu, se não é famoso, é também em shows ao vivo que você vai ganhar mais. Porque até sua música tocar o suficiente em streams online para você ganhar dinheiro, pode demorar bastante... Um fã pode voltar num show mil vez porque ele sabe que cada vez o artista vai tocar aquela música com nuances diferentes, mas talvez ele não ouça a música gravada as mesmas mil vezes. Se ouvir, parece que se tornou normal os provedores de streams não repassarem corretamente os pagamentos aos artistas por falta de controle. Isso é outra coisa que a Avid está tentando resolver.

O que estamos vivenciando agora me lembra um pouco de quando a AOL [America Online] comprou a Time Warner, que foi a maior junção deste tipo até então. O ponto na época desta negociação era que eles já achavam que o poder de distribuição era mais importante do que o conteúdo. O mercado acreditava que o que a AOL fazia [distribuição digital] valia 20 vezes mais do que o que a Time Warner fazia [ter conteúdo, catálogo]. Esta foi a maior negociação até então, e o maior fracasso rápido também. Por que? Porque por melhor que seja o poder de distribuição, ele não vale nada se o conteúdo não for excelente. A mesma coisa aconteceria com "compartilhamento e colaboração em nuvem" no mercado de música. Sim, a tecnologia de compartilhamento é muito bacana, mas e se quem estiver colocando material nessa nuvem não for sensacional?

No final, vai existir um produto que simplesmente ninguém vai querer. Usar a tecnologia de nuvem para conectar uns aos outros pode ser muito eficiente, mas só funciona se estivermos conectando os melhores. Então, a internet para isso não é a solução para o mercado de música. A internet é somente o veículo. Resultado: a AOL foi vendida recentemente por uma fração do que já valeu.

Baseado nesse grande exemplo de fracasso da AOL com a Time Warner por falta de valorização de conteúdo, você acredita que o caminho tomado pela Apple, de primeiro inventar o "player" iTunes em formato de software apenas, depois buscar conteúdo com o catálogo das gravadoras e hoje ter se tornado um grande portal de distribuição de música online, foi um caminho inteligente?

Eu acho que tudo está indo na direção certa. E, sim, a grande jogada da Apple foi o iTunes. Não tenho certeza se lá hoje é o melhor lugar para vender suas músicas, pois eles entraram relativamente atrasados no serviço de streaming. Eles são fortes, mas não sei se são os mais fortes. Se você olhar para o que nós, a Avid, estamos tentando criar... Estamos tentando criar o Avid Media Central, de forma que todos poderão criar, gerenciar e distribuir a partir da mesma plataforma. Para nós, o futuro é um mundo onde qualquer artista, seja dando os seus primeiros passos ou já consagrado, esteja usando o Pro Tools e nossos consoles, ao vivo ou no estúdio, e possa se conectar com toda a cadeia de composição, produção, distribuição e venda usando o mesmo sistema operacional, que seria o nosso Avid Media Central, criado há três anos e que roda por baixo de todos os nossos softwares.

Depois de criado o Media Central, nós adicionamos os nossos aplicativos, e agora estamos adicionando aplicativos novos, e então mais aplicativos gratuítos, e finalmente entraremos com distribuição nesta plataforma, no Media Central. A Rede Globo por exemplo, provavelmente usará muitos aplicativos rodando no Media Central. Por outro lado, pode ser que um músico só usará o Pro Tools e talvez outro app de colaboração através de nuvem, e claro, o Market Place, que é onde serão postados os trabalhos finais para venda e/ou monetização. Com isso, o consumidor poderá diretamente acessar estes trabalhos finalizados ali postados. Estamos conectando todos os artistas! Hoje temos 8 milhões de artistas ou mais usando nossa plataforma.

Se os broadcasters [empresas que transmitem áudio e vídeo, televisões, rádios, portais online...] quiserem o seu produto [sua música], eles terão acesso. Tudo fica mais barato e eficiente assim. Um compositor faz uma música para um filme no Pro Tools, o produtor de imagem trabalha usando o Media Composer e o distribuídor, como, por exemplo, a Apple, pode, então, acessar esse material usando a mesma plataforma. Tudo fica integrado.

E como fica a solução para um dos maiores problemas que temos hoje, que é a desproporcionalidade de quanto ganha um distribuidor [streamer] em relação a um artista que tem sua música tocada online? Bem, temos algumas maneiras de solucionar isso. A primeira delas é usar tags automáticas, ou seja, indexar todos os arquivos, o que já fazemos hoje em dia. Ainda não encriptamos esta informação, mas quando o fizermos, ninguém poderá mais dizer que não sabe de que sessão veio esse arquivo, essa gravação ou este intrumento originalmente. Por exemplo, o YouTube não vai mais levar um mês pra identificar que um vídeo que não pertence a quem o postou está sendo assistindo três milhões de vezes de graça antes de ser finalmente interditado. O YouTube continua ganhando seu dinheirinho porque um vídeo com três milhões de views monetiza através de anunciantes. Mas se durante aquele mês o tal vídeo não tinha dono, adivinha quanto o dono daquela obra recebe? Nada.

Você vai a uma boate, DJs tocam inúmeras músicas muito bem mixadas que pertencem a artistas que não estão ganhando nada por estas execuções públicas. Então, nós finalmente poderemos saber de onde veio cada sessão, cada som, cada track, cada performance, de qual estúdio, porque seus "endereços" estarão gravados e impregnados nos arquivos de forma não violável ou removível. Quando chegarmos a este ponto, quero que consigamos registrar tudo, inclusive a master final feita no Pro Tools, e ninguém vai poder dizer que não sabe de onde veio essa música. Finalmente poderemos devolver o dinheiro a todo mundo que trabalhou.

Você diria que este sistema seria como um novo e melhorado ISRC?

Talvez. O que estamos tentando fazer é simplesmente incorporar esse sistema [de marcar, indexar] na plataforma de forma automática. O que eu havia pensando era que alguém teria que dar o pontapé inicial nesse assunto, e a Avid é grande o suficiente para essa tarefa. Nós podemos e temos que fazê-lo. Clientes nossos como Abbey Road e Universal também não querem "se dar bem" em cima dos seus artistas. Para eles, se nós desenvolvermos uma tecnologia [de indexação] assim, seus artistas vão ganhar mais dinheiro, uma vez que a gravadora terá menos prejuízo. E se nós pudermos estar indexados como donos da master, nós seremos, de fato, donos do bem, e sem ter que perder dinheiro para intermediários.

Então, para as gravadoras, o que elas mais desejam é que nós consigamos fazer essa tecnologia se tornar realidade. Então, voltando ao motivo pelo qual entramos nesse assunto, foi para falar dessa falta de "endereçamento". O mercado de broadcast está tentando evitar os problemas que a indústria da música vivenciou e está vivenciando. Parece que a indústria de broadcast aprendeu com a indústria da música, então eles querem ter o total controle de como e quando cada material está sendo distribuído, com muito cuidado em relação a gerenciamento de direitos. Eu diria que o broadcast está numa transição, e a música vivencia um colapso, que pode e deve ser consertado. 

Eu acho que fica mais fácil de "consertar" o problema dos direitos da indústria da música quando se conhece o sistema como um todo da forma como a Avid conhece, por atuar de maneira tão abrangente nesses vários mercados, não apenas em música, mas também em broadcast e em tecnologia. Conhecer como tudo funciona pode realmente ajudar, nesse momento, a consertar a indústria da música e fazer com que ela gere e repasse dinheiro como já fez um dia. Eu peço desculpas por talvez não ter conhecimento tão pleno de todas as atuações da Avid nos mercados neste momento, uma vez que o meu foco, que a minha área de atuação é realmente dentro do mercado do áudio e da música. Sendo assim, não sei se entendi corretamente, mas baseado em tudo que você falou até agora, me parece que a Avid está entrando num mercado de gerenciamento e venda de música como a Apple faz com o iTunes Store e agora com o Apple Music. Estou entendendo certo? Sei que vocês estão por trás de toda essa evolução tecnológica, mas a minha pergunta é - gerenciar a "monetização", os lucros de quem trabalha na música, é parte dos planos da Avid?

Sim. Nós começamos pelo problema, e então encontramos a solução para ele. E qual é o problema? Nos últimos dez anos a quantidade de conteúdo musical no mundo se multiplicou quatro vezes. Ou seja, hoje temos quatro vezes mais músicas e artistas variados pra ouvir do que tínhamos dez anos atrás. A notícia boa é que as ferramentas de gravação hoje são bem mais acessíveis, mas justamente isso gera mais competição pelo espaço, pelo espaço de poder ser escutado. E a vasta maioria dos músicos e artistas entram na música não pelo dinheiro em primeiro lugar, mas para serem escutados.

Confesso que achei que tínhamos não quatro vezes mais gente produzindo música hoje em dia, mas pelo menos 40 vezes mais! Antigamente, para se ter um disco gravado, o artista tinha que ser um entre milhares a ser escolhido pela gravadora. Hoje ele compra um Mac, instala um Pro Tools ou qualquer outro software, e pronto - ele dá um jeitinho de se gravar, ou contrata alguém que dá um jeitinho de gravá-lo. Estou errado na minha conta imaginária?

Não! Você tem razão, sim. Quando eu digo "apenas" quatro vezes mais músicas e artistas, me refiro a material contabilizado, gravado, mixado, produzido, lançado profissionalmente. Nas nossas estatísticas nós chamamos isso de material "drasticamente editado", ou seja, mixado e/ou editado por um profissional. Sendo assim, o mercado profissional está gerando quatro vezes mais material musical do que gerava dez anos atrás. Agora, o número de músicos e/ou artistas registrados nos Estados Unidos subiu 70%. Sim, é bastante, mas não é muito se comparado aos 400% do aumento de material produzido. Isso significa que tem gente trabalhando pesado, pois o aumento de pessoal não é tanto se comparado ao aumento de material. E não podemos esquecer que a média de pagamento caiu quatro vezes. Se você tá no topo do topo, você talvez esteja ganhando mais. Mas, fora dali, tá todo mundo fazendo menos dinheiro.

Então, vejamos esse comparativo [nesse momento, Louis mostra um gráfico]. Aqui está a distribuição de música, que significa como nós consumimos música, como ela, teoricamente, chega a nós. Esta cresceu dez vezes! 1.000%. O consumo em si cresceu 50%. Muito bom. Comparativamente é pouco, mas pense na sua vida, no seu dia a dia, o que é aumentar algo qualquer em 50%. Esses 50% significa tempo. Ou seja, estamos usando 50% a mais do nosso tempo pra ouvir música. Como nosso tempo tem um limite óbvio, aumentar a alocação dele para música em 50% é bastante. Agora, aqui está o grande problema: o orçamento total investido em todos os tipos de mídia cresceu apenas de 3 a 4%. Sabemos também que a distribuição digital, gerenciamento de catálogo, gerenciamento de direitos, realidade virtual aumentada, subiram de 17 a 30%. Estes subiram de 17 a 30%, mas o orçamento só aumentou em 3 ou 4%. Como fechar essa conta? De onde está saindo essa poupança? Essas reservas?

Tem que cortar as despesas em algum lugar, e esse lugar está sendo justamente na parte de criação e produção. Como diria a AOL, 'precisamos gastar mais em distribuição! Onde vamos economizar? Na criação'. Não é que a criação não seja importante. Mas parece que esta fórmula a gente já sabe fazer. Imagine que eu estou falando agora com um executivo de mídia e broadcast, da Disney, ou com o Raimundo Barros, da Globo. Aliás, vocês, brasileiros, têm uma sorte danada de ter um executivo como ele. O Raimundo e a Globo podem competir com quaisquer das maiores empresas similares do planeta. Então aqui tá o problema - temos quatro vezes mais concorrência para os meus shows ou minhas músicas. Eu tenho que pagar dez vezes mais para conseguir distribuir em todos esses canais digitais. Eu tenho mais gente assistindo, sim, mas somente 50% a mais, que não chega aos pés dos 1.000% a mais em opções de distribuição.

Então, para eu conseguir atrair essa gente para o meu produto é muito mais difícil [e caro] em marketing e anúncios. E eu só tenho uns 3% a mais de dinheiro pra resolver esse problema todo. Isso é uma exemplo de como trabalhar com áudio e vídeo, com música, com mídia, é divertido! Para quem pensa que é só diversão! (risos) Seria como se alguém dissesse pra você que você teria um aumento de salário de 3% pra você produzir quatro vezes mais material musical do que você produzia antes e direcioná-lo para dez vezes mais canais e formatos. Pois é. É isso que a indústria está vivenciando neste momento.

Na verdade, essa conta é para mídia em geral, incluindo jogos eletrônicos, esportes, filmes, noticiários... porque no mercado da música a conta é ainda pior. Enrico, a sua pergunta lá atrás foi se estávamos fazendo algo como o iTunes, e eu relembro o problema que temos nas mãos, que é conectar quem cria a quem consome. E o jeito de fazer isso é através do Avid Marketplace, onde os artistas e profissionais de uma maneira geral podem ter seus "bens" disponíveis para os consumidores. E esse Marketplace é o único elo dessa corrente que ainda não está em funcionamento.

Então, temos aqui um resumo da nossa "cadeia de produção": temos as ferramentas de criação, que são o Media Composer, Pro Tools, Sibelius etc. O Studio Suite é como otimizamos atividades Live [ao vivo] e esportes. São trabalhos em gráficos, efeitos em esportes, efeitos em câmera lenta, realidade aumentada, realidade virtual. Esses são apps, como os do seu telefone, que existem dentro da nossa Suite. Então é necessário gerenciar a mídia. Aí temos o Midia Asset Management, Production Asset Management, Social Media Management, Distribuition Playout, Storage Archive... e o Marketplace é a comunidade dos artistas, que é baseado em nuvem.

Se você for um membro, você registra o seu perfil, põe lá a sua contribuição, seja você um compositor, um diretor, um cantor, um guitarrista, um engenheiro de mixagem. Você encontra e passa a conhecer outros membros da comunidade, posta seus trabalhos e estes podem ser avaliados por outras pessoas. Aí, digamos, algum membro está com um projeto em andamento e precisa que ele seja mixado. Nessa comunidade, um artista pode encontrar o engenheiro que ele procura.

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Confira a Parte 2 da entrevista em http://musitec.com.br/noticias/?c=2603.
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