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Revista Luz & Cena
Entrevista
Manual Prático da Música Instrumental
Ed Motta usa o antigo para criar o novo em seu CD Dwitza
André Luiz Mello
Publicado em 16/06/2005 - 00h00
Sérgio Boi
 (Sérgio Boi)
Dwitza (Universal), o novo disco do cantor, compositor e multi-instrumentista Ed Motta, bem que poderia se chamar As Terceiras Intenções do Manual Prático. Os dois volumes do Manual Prático para Festas, Bailes e Afins lançados desde 1997, na volta de uma reciclagem de um ano nos Estados Unidos, apostavam num repertório dançante soul/funk, incluindo os sucessos Fora da Lei e Colombina.
O que dá lastro ao novo disco, a realização de um velho sonho de incursionar pela música instrumental, é que foi previsto em contrato, proporcionando total liberdade artística, evitando o desgaste gerado entre Ed e a gravadora Warner após o lançamento do sofisticado Entre e Ouça (1992). Trata-se de uma abordagem diferente do que fazem os músicos dedicados ao gênero. São faixas curtas de arranjos criativos, com timbres inusitados em que a voz é usada como um instrumento, muitas vezes fundindo-se com os sopros. "Eu queria misturar o requinte da música instrumental com a leveza da música pop." E conseguiu. Ele usa conceitos antigos de produção que soam como novidades diante da padronização atual: instrumentos saltando uns sobre outros na mixagem, a ambiência da sala de gravação, a ausência de click, com uma conseqüente variação de andamento. Pela primeira vez usou o Pro Tools e admite que os teclados vintage nunca soaram tão bem, embora continue preferindo baixo, bateria e voz na velha fita. Ed trabalhou no estúdio AR, no Rio, com o engenheiro Duda Mello e os dois gravaram tudo em 20 dias, com um time seleto de músicos. Apenas duas músicas têm letras, um mínimo indispensável para que o álbum não corra o risco de passar em branco pelas rádios: Doce Ilusão, parceria com Nelson Motta, e Coisas Naturais, dele com Ronaldo Bastos. Senhoras e senhores, Ed Motta.

Frases
"O novo não existe mais, o mundo não tem mais para onde ir, não tem mais o que ser feito."
"A coisa mais antiga que tem é querer ser moderno."
"A classe artística ainda não enxergou que o que se faz dentro de um estúdio é arte junto com a música"
"Nesse 'país maravilhoso', as pessoas de talento têm que contar com a sorte o tempo inteiro."

"OS ARTISTAS TÊM VERGONHA DE DIZER QUE PRECISAM PAGAR CONDOMÍNIO E GASOLINA"
Em entrevista publicada na M&T (capa de setembro/ 2000), você destacou a aura e a atmosfera de um gravador de 2", e que o computador nunca teria essa emoção. Agora você grava em Pro Tools. Como explicar uma mudança drástica em tão pouco tempo? Isso vem provar que a culpa não é da mídia e sim da linguagem que se estabeleceu da "espremeção de som"?
Eu sou um analog addict radical. Mixamos para cinco padrões porque eu sou paranóico com negócio de backup. Também salvamos os solos alternativos de todas as músicas. O Pro Tools foi usado como se fosse uma Studer, mas uma Studer que tem milhares de facilidades, não como uma ferramenta da criação. Não afinamos nada. E tivemos a vantagem de ter as sessões sempre na mão. O impressionante é que quando o Duda tocou a mixagem em fita, eu senti - com toda sinceridade - que a fita melhora instrumentos como baixo, bateria e voz. E posso declarar sem medo que o Pro Tools melhora outros instrumentos na medida que ele é o som real. Eu nunca vi o Rhodes e o Wurlitzer soarem tão bem quanto no Pro Tools. A fita achata, comprime um pouquinho. O disco foi gravado em computador, mas quando você ouve, diz que foi gravado em fita. E a praticidade disso é impressionante. Se não fosse o Pro Tools... Na outra vez eu estava muito estressado com a coisa das máquinas mesmo, aqui já está tudo sincado. Também não consertamos nada de tempo. A edição foi só de mute. A gente gravava três takes e geralmente o que valia era o primeiro ou o segundo. É um disco instrumental, eu tenho infinitamente menos recursos do que quando gravei o meu disco pop. 


Tudo foi gravado ao vivo?
Teve um pouco de ensaio na minha casa. Foram combinações, não foram ensaios. Até porque eu queria uma sonoridade natural, uma interpretação. Essa inspiração de colocar os metais com a voz veio do nosso mestre Moacir Santos (maestro e saxofonista, radicado há décadas nos EUA, considerado um dos grandes responsáveis pela renovação harmônica na MPB e que ganhou recente tributo liderado pelos músicos Zé Nogueira e Mário Adnet), que o Duda teve oportunidade de gravar e mixar em Ouro Negro, que deu uma força para a volta da música instrumental no Brasil.

As vozes soam naturais porque você usou o efeito de proximidade, há uma dinâmica...
A concepção desta mixagem - que não é mais utilizada lá fora - é ter alguns instrumentos saltando e não aquilo baixinho, num "sanduichinho" de som. Da década de 70 pra trás, a música sempre teve um instrumento um pouco mais alto. Usamos o som da sala (acústica) e menos o som próximo (microfone). Hoje em dia você coloca um reverb e acha que resolveu.

A segunda faixa (No Carrão Me Perdizes na Consolação) dá a sensação de ter acabado cedo demais... Nos faz querer ouvir mais.
Na hora de fazer música instrumental, inevitavelmente vou incluir minha vivência com a música pop. Essa formatação é muito agradável. No jazz você pensa: "puxa vida, o solo do cara foi tão grande que a gente só vai ouvir essa música semana que vem". Não acho isso ruim, mas eu queria misturar o requinte da música instrumental com a leveza da música pop. O motivo de o disco ter duas músicas com letra é simples: eu quero que toque no rádio também. O lado pragmático do mercado é nebuloso porque os artistas têm vergonha de dizer que precisam pagar condomínio, gasolina, comida, livro, disco, enfim, a vida de todos nós. É uma dádiva poder fazer o disco neste formato. Apesar de ser instrumental, estou mais pra Hitchcock que pra Buñuel. Eu quero que encha o cinema também.

Com qual guitarra o Paulinho Guitarra gravou Lindúria?
Eu sou um radical de Fender e Gibson. Ele trouxe uma Schecter semi-acústica. "Ai meu Deus, o Paulinho vai vir com essa Schecter, puta que pariu. Mas o solo vai ser de Les Paul". Ele mal mexeu na equalização do amp, o Duda viu o nível e deu REC, essa é sempre a política: REC sempre. Foi assim que Jimmy Page gravou o solo de Stairway to Heaven. O Paulinho gravou não só o solo, como todos os "comentários" no primeiro take. Alguma coisa a gente editou, lógico. Na mão dele uma Telecaster pode virar uma Les Paul... É impressionante. Ele toca comigo desde 92 e já pegamos desde o Théâtre du Châtelet, em Paris, com o melhor som do mundo, até aquela roubadíssima. Não importa o amplificador que seja: com ele um Jazz Chorus (Roland) pode soar como um Fender Twin Master. Ele liga, dá aquela vibrada no mi, blues total...

A responsabilidade por muitos problemas atribuídos ao CD não é do CD, e sim da masterização. Você acha que a mídia estraga ou que o processamento também contribui muito?
Tem um pouquinho de cada coisa. Eu sou um cara um pouco radical. Aqui nós fizemos não só o reverb ser natural como a equalização, que foi conseguida na microfonação. É o som da sala mesmo, não tem processamento. Os compressores não foram usados. Todas as músicas foram gravadas sem click. Naquele solo de guitarra em Lindúria, as "secadas" (paradas) foram a sentimento mesmo e com ajuda do nosso bom Jesus. O que há é a contagem 1, 2, 3. A música fica com uma flutuação de andamento. O meu primeiro disco é de 88, eu já entrei no estúdio ouvindo um termo que as pessoas usam muito: "funciona". Nada pra mim em música funciona. O que funciona é máquina. Vem da música enquanto indústria, uma coisa totalmente declarada e que "tem que funcionar". Vários produtores se habituam a ouvir assim: "correu ali" ou "deu uma desafinada". Mas a música tem que desafinar, tem que correr. Os melhores discos do mundo, sejam de jazz, de soul ou de rock, não têm uma afinação absoluta porque seria aquela assepsia total.

NO ESTÚDIO
Dwitza foi gravado e mixado entre cinco de novembro e 1º de dezembro de 2001 em Pro Tools nos AR Studios (RJ) por Duda Mello, que utilizou pré-amps externos API 512 e Neve 1074. A voz principal foi captada através de um Neumann 249, o favorito de Ed. Processadores externos não foram utilizados. A acústica da sala de gravação foi valorizada por dois microfones Earthworks TC 40, que captavam o ambiente (e quando necessário, a reverberação natural), tanto para vozes quanto para instrumentos.
Como de costume, a masterização foi sob responsabilidade de Carlos Freitas, da Classic Master (SP). "O que mais me impressionou é que o Ed era adepto do analógico e essa masterização foi feita em digital (24 bits/ 44.1 kHz). Teve um pequeno problema: ele não me deixou mexer em nada (risos). Se alterar meio dB em 10 kHz ele já percebe", comenta o engenheiro. Como o compositor não queria compressores por perto, a saída foi masterizar manualmente, tirando-se alguns picos com a ajuda da workstation Sonic Solutions HDSP (e com o processador TC Electronic System 6000), o que confere bastante dinâmica ao disco.

"A PIRATARIA É TÃO MAL EXPLICADA QUANTO A GUERRA DO AFEGANISTÃO"
É forte o movimento de retomada da música instrumental no país, seja com shows ou discos. O seu novo trabalho combina com essa volta.
Essa história dos DJs, da música eletrônica e do rap tem um lado anti-musical. E tem um lado interessante, porque todos eles provocaram na nova geração uma certa curiosidade em relação à origem de alguns sons sampleados. O que está faltando no cenário instrumental brasileiro é um pouco menos dessa visão tecnicista, infectada pela Berklee (College of Music)...

Uns tocando iguais aos outros.
Tudo filhote da fase ruim do Chick Corea, e tem tanta gente boa com possibilidades de fazer coisas legais... O grande problema é essa coisa meio olímpica de quem toca mais rápido. Então é por isso que o pop sempre conquistou as pessoas. Muito mais na música instrumental, em que há falta de síntese. E também por essa falta dos elementos extra-musicais que a música instrumental tinha na década de 60 e 70: a capa do disco ser boa, o nome ser legal, a entrevista também... Acredito que tem um movimento... (pára e pensa) ...esse negócio de movimento é um perigo, eu detesto esse negócio de movimento... Talvez por eu ser um cara muito egocêntrico, eu já não queira fazer parte de movimento nenhum (risos).

Há muito interesse na produção de soul e funk dos anos 70, muita gente falando do saxofonista J. T. Meirelles (um dos pioneiros na formação de grupos instrumentais no país e um dos criadores do samba-jazz, que teve seu elogiado disco O Som, de 1964, reeditado em 2001).
Acho que isso vai acabar se refletindo na música instrumental, no pop ou no que vier pela frente. Talvez no Rio de Janeiro as coisas demorem um pouco a chegar. São Paulo vive uma realidade como se fosse Londres, com tendências, cenas. Então São Paulo já sabe que Wurlitzer é lance, baixo de quatro cordas... No Rio o (baixo) Fodera ainda é "o grande lance", a guitarra Tom Anderson, o tecladista que fala "eu tô com um puta rack". A coisa mais antiga que tem é querer ser moderno.

Na entrevista com o engenheiro de som Marcelo Sabóia (capa da M&T de janeiro de 2002), que gravou e mixou o seu disco anterior, há uma crítica a seu respeito. Ele diz que você procura sempre o que já foi feito e nunca o novo.
Isso eu acho maravilhoso. É um elogio.

Mas ele falou em tom de crítica.
Isso é ótimo. O novo não existe mais, o mundo não tem mais para onde ir, não tem mais o que ser feito. Daqui pra frente só vai ser pior, só vai ser pra trás. Vai virar Matrix, vai virar 2001 - Uma Odisséia no Espaço. Eu busco a sonoridade natural dos instrumentos. Acaba que, no fundo, o que estou fazendo é novo. Estamos aqui escrevendo uma nova história de uma nova coisa, mas com elementos do passado. Mas não uma coisa radical. Tanto que estamos usando microfones Earthworks e o Pro Tools. A modernidade está sendo usada com inteligência, com consciência.

Isso não pode ser aplicado também à guitarra Tom Anderson, ao baixo Fodera e às baterias eletrônicas?
Isso é um perigo... A Tom Anderson não desafina nunca, é uma praga no Rio de Janeiro. Espero que Deus ilumine o meu caminho e que eu não precise mais usar bateria eletrônica na minha vida...

O Edgard Scandurra dorme com uma Groovebox (Roland).
Eu tenho uma em casa. Quando chega visita eu escondo, para que ninguém veja a minha Groovebox. Eu tenho vergonha, sinceramente.

O efeito negativo que a pirataria está causando no mercado não faz com que as gravadoras fiquem mais maleáveis em relação a projetos como o seu? Até mesmo pelo fato de Marisa Monte colocar pé firme com a EMI (e de ter criado o selo Phonomotor) e também com a recente ida de Maria Bethânia para a gravadora independente Biscoito Fino.
Isso é difícil de responder. No meu caso, foi uma exigência de contrato. Ao invés de pedir um carro importado, preferi um disco. Não sei se as gravadoras estão querendo fazer tantos discos como este. Os discos de qualidade nunca seriam vendidos em forma de pirata porque o ouvinte especializado quer ter o encarte, a coisa original. Esse assunto é muito complexo e eu prefiro me abster. Acho tão mal explicado quanto a guerra no Afeganistão. Se tiver que fazer algum tipo de revolução, prefiro que seja através da música. Não que eu seja um cara passivo e inconsciente. Eu estou mais pra Paul McCartney do que pra John Lennon, sou mais interessado em fazer uma grande canção do que em mudar o mundo. Essa história do pirata é muito mal explicada, não é bem isso aí não. Mas vamos nessa, história da Carochinha... Vamos receber o presente do Papai Noel. Tem um ponto chave - que eu não vou falar de jeito nenhum - que as pessoas nunca se questionaram, é um ponto de quem vê muito filme. Para mim está nítido quem é o vilão e ninguém está vendo. O vilão é o mocinho (risos). Sempre foi. O meu ato é de um romântico, de um cara que acredita que a vida não é só dinheiro, não é só vender 200 mil cópias e lotar o ATL Hall. Eu poderia perfeitamente me acomodar, fazer um disco acústico ou um disco cantando músicas de não sei quem: "Ed canta Edu Lobo, Ed interpreta Chico", e de preferência ao vivo e acústico, é só equívoco... O mercado vive disso. A coisa está feia e chegou num ponto em que eu não sei como é que o público ainda não percebeu.

 

"NÃO ACREDITO EM PRODUTORES E, SIM, EM COMPOSITORES, INTÉRPRETES E ARRANJADORES"
Voltando a Berklee: lá o ensino é bom, mas querer transformar aquilo num estilo segundo o qual você vai tocar qualquer tipo de música com aquelas regras já é demais...
São raras as coisas que estão fora do padrão "Los Angeles" de som. E no Brasil tem um problema: a classe artística ainda não enxergou que o que se faz dentro de um estúdio é arte junto com a música. Um fader levantando, o equalizador ir mais pra cá ou mais pra lá não é uma coisa técnica. É arte também. Há o medo de arriscar, a padronização da arte. Existe uma polêmica da minha parte quanto a essa denominação de "produtor". Eu não acredito em "produções e produtores", mas em compositores, intérpretes e arranjadores. Eu realmente não sei o que um produtor faz nos estúdios. Eu faço os arranjos, a base... produzir... o que é produzir? Produzir é escolher os músicos? O único disco que eu co-produzi foi o Manual Prático para Festas, Bailes e Afins (1997), com o Liminha... [na verdade, seu 1º disco solo, Um Contrato com Deus, de 1990, teve a co-produção do baixista Bombom].

Quer dizer que o Liminha não fez nada...
Aí é que está a questão. Ele fez, é um grande profissional. Mas eu sou um cara que não trabalha com produtor. Porque infelizmente eu tenho certeza do que quero fazer, de tudo... desde a fonte que vai ser usada na minha capa até quem vai tocar qual instrumento. Eu durmo três horas por dia. "É muito importante ter alguém de fora pra te dar uma crítica". Isso é coisa da arte industrial. Tinha alguém para dizer alguma coisa importante a Mozart, Beethoven, Bach, Debussy, Fauré?

E no caso do George Martin?
Cuidado com ele... Fora Beatles, eu não lembro de nada que ele tenha feito.

Ele foi ensinando-os a trabalhar no estúdio. E à medida em que os Beatles foram dominando, passou a trabalhar em função do que eles queriam.
A coisa mais criativa dos Beatles - Rubber Soul, Revolver e Sgt. Pepper - pra frente tem todo o mérito deles. O George Martin organizava as coisas. Fora do Brasil existem vários artistas que trabalham com excelentes produtores e outros que não trabalham com produtores. Aqui no Brasil você conta nos dedos ou talvez não exista. Talvez eu seja o único cara que se auto-produz [na verdade, Djavan já se auto-produz há alguns anos]. A maioria dos artistas precisa de uma babá no estúdio dizendo "faça isso, faça aquilo". Estão todos altamente confusos. Rapaz, eu não tenho confusão, tenho certeza. Eu tenho 20 mil discos, eu já ouvi coisa pra caralho. Não é pretensão, é pesquisa. Mais uma vez criticando: a classe artística não compra disco, não pesquisa música, não estuda o instrumento. A ligação maior com a música é gravar o acústico pra pagar a reforma no apartamento.

Ainda continua a sua aversão à passagem de som e à sonorização? Até alguns anos você tinha mais relutância em fazer shows do que agora.
Eu nem posso ter relutância, na medida em que o show é o meu sustento. Se eu fosse rico, ia ficar em estúdio. Porque o meu negócio é estúdio, a perfeição, a altura certa. No meu show, o som nunca está no plano que eu quero. O PA nunca está certo. A guitarra está baixa, o naipe está sempre horroroso, não botam nunca o trombone - parece que têm ódio do trombone - aí fica só aquele trompete terrível, aquele agudo só no reverb, só na linha auxiliar...

 

Mas você não viaja com os seus engenheiros de som?
Sim, mas eu faço isso pra evitar o CTI. São só pequenas cirurgias.

Não há uma forma de tentar "curar" isso?
Os microfones já são todos "tombados", já começa com o som diferente. No show Músicas Antigas e Algumas Inéditas [2000], o Massa levou os microfones do estúdio dele, dois AKG 414 na bateria... Aí tudo bem. É o "lado bom" da América. Eu tenho prazer, o show me relaxa muito hoje, ao contrário de outros artistas que levam mais a sério o espetáculo, a cena, a cenografia, o palco... Eu cago pra essa merda. Não sou um cara performático. "I'm a musician!", entende? E dessa vez não "piramos na mix". O estúdio tem uma coisa fascinante: é o som vir de duas caixas. Pra mim a música é left/right. Não gosto de ouvir em 40 falantes de 15"... O som de um PA é uma coisa muito feia. Eu gosto do ao vivo em clubs, o som da bateria vindo do baterista e não do PA. Eu fiquei muito mais calmo pra gravar este disco não só pela tecnologia, como pelo trabalho com o Duda, que é um cara extremamente calmo, o que é uma coisa difícil, porque no estúdio as pessoas ficam nervosas.

Então disco ao vivo nunca mais [em sua discografia, há o Ao Vivo, de 1993]...
Não, que é isso! Se me pagarem bem eu estou fazendo qualquer coisa (risos). Só quero ter espaço para fazer a minha música de verdade. Se tiver espaço, eu não me incomodo em fazer a música para tocar na FM ou o playback do programa infantil. Não me agride. Se viabilizar o outro lado está tudo bem. O que me agride é ter que esperar muito tempo para fazer um outro disco como este. O que está aí é exatamente o que eu penso da música.

Dwitza, Faixa a Faixa, por Ed Motta
Um Dom Pra Salvador
"Esta faixa abre o CD e a idéia de compô-la surgiu a partir de um acorde da música Moeda, Reza e Cor, do disco (Som, Sangue e Raça) Dom Salvador e Abolição".
No Carrão Eu Me Perdizes na Consolação
"É uma homenagem a São Paulo e ao período do final da década de 70, início de 80, do movimento das bandas instrumentais: Metalurgia, Freelarmônica, Pé Ante Pé, Pau Brasil..."
Sus-tenta
"Recebeu esse nome por dois motivos: o Sidinho Moreira (percussionista) tem um jargão quando o clima está meio estressado. Ele diz: "sustenta!"; o outro motivo é que ela é toda feita com acordes de sus-four, que é um idioma típico do hard-bop, do post-bop. Vem do disco Maiden Voyage do Herbie Hancock, de 1965. Influenciou todo o pessoal de soul-jazz."
Doce Ilusão
"A música é minha e a letra é do Nelson Motta. É um samba-canção, um bolero. Fui extremamente influenciado pela Suely Costa, que acho uma compositora genial".
Lindúria
"É em homenagem à minha mulher. Quem participou foi o trio básico: Alberto Continentino no baixo, eu no piano Wurlitzer e voz, Massa na bateria; Renatinho Fonseca no órgão, Sidinho na percussão e Paulinho Guitarra".
Valse au Beurre Blanc
"O Beurre Blanc é um molho famosíssimo do sul da França. E na música eu faço um francês com vários nomes franceses de vinhos, queijos... E tem uma participação do coro lírico do Teatro Municipal e aquela formação francesa clássica: violino, acordeon, o Jotinha Morais no piano, eu na guitarra semi-acústica e voz".
Amalgasantos
"É dedicada ao Moacir Santos. Um motivo musical que está muito presente no disco é o compasso seis por oito, que vem dos discos de jazz afro-centristas".
A Balada do Mar Salgado
"Esta tem trombone, sax tenor e trompete e depois uma sobreposição de um melofone, um instrumento pouco usado que fica entre a trompa e o flugelhorn, e o bombardino, que é intermediário entre a tuba e a trompa. E há um dueto com a cantora Leila Maria".
Coisas Naturais
"Música minha, com letra do Ronaldo Bastos e minha. Depois de tomar uma garrafa de vinho eu fico metido a letrista... São quatro percussionistas ao vivo, todos juntos".
Malumbulo
"É um seis por oito, afro cuban jazz".
Madame Pela Umburgo (no seu teatro dos olhos)
"Tem vários andamentos diferentes e um arranjo a quatro mãos com o Jota Moraes. A formação foi inspirada nas trilhas de cinema italiano: cravo, violão de doze cordas, fagote, cello e Wurlitzer".
Cervejamento Total
"É um samba, psicodelia pura... Tem Hohner D-6 Clavinet com um phaser da MuTron, que é um bi-phaser, com dois tempos de phaser diferentes".
Papuera
"Essa é o verdadeiro workshop dos teclados ARP: String, Odissey, Omni, Omni 2 e o 2600, que é aquela parede de fios. Este é o melhor teclado que existe. A música é um cinco por oito, mas que não fica acentuando a questão do compasso composto".
Instrumetida
"É curtinha e começa com voz e Rhodes, como naqueles discos que se levam a sério: introdução de voz e piano e depois uma orquestra. Isso é o sonho de ego do compositor. Nesse caso foi uma orquestra de metais ao invés de cordas. Tem tuba, duas trompas, quatro trombones, cinco saxofones, três trompetes, um clarone e um oboé. O arranjo é do Jessé Sadock Filho, que toca trompete na minha banda e na Orquestra Sinfônica".

Um time de primeira
Dwitza teve um trio-base formado por Ed Motta (pianos Rhodes e Wurlitzer), Alberto Continentino (baixo) e Renato Massa (bateria). Além de Paulinho Guitarra (idem), Jessé Sadock Filho (trompete, flugelhorn, melofone e arranjos), Lelei (sax), Aldivas Ayres (trombone e bombardino), Jota Moraes (vibrafone, piano e arranjos), Fábio Fonseca (teclados analógicos ARP 2600, ARP String Ensemble, ARP Omni e ARP Odyssey) Teco Cardoso, Marcelo Martins, Henrique Band, Idriss Boudrioua e Zé Canuto (sax), Chico Batera, Sidinho e Marcelo Salazar (percussão), Jaime Alem (violão de 12 cordas), Renato Fonseca (órgão), André Rodrigues (baixo), Marcelo Fagerland (cravo), Jaques Morelembaum (cello), coro lírico do Teatro Municipal.


 
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