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Revista Luz & Cena
Análise
Staner Tube One
Uma válvula, muitos sons
Sólon do Valle
Publicado em 15/06/2005 - 00h00
Divulgação
 (Divulgação)
Perdoem-me os hi-technicistas, mas um amplificador de guitarra tem que ter "alma". Não desprezo os benefícios da tecnologia digital - muito ao contrário, vejo-os como a solução para repor o calor, o espírito, ou o que você quiser chamar, dentro dos frios ambientes transistorizados e digitais. Em meus artigos nas edições anteriores, mostrei bons exemplos disso.
No entanto, para um músico, especialmente no palco, nada substitui a presença marcante do bom e velho amplificador de guitarra, com seu farto volume de som, sua "sujeira", e a sensação de segurança e de poder que dele emana.
A tal "alma" do amplificador reside no timbre gostoso de se ouvir.
Com um novo combo que une timbre "quente" a boa potência de saída, temperados com efeitos digitais, a Staner entra para o seleto time dos amps com personalidade forte.

Apresentando o Tube One
O nome do novo amplificador Staner - Tube One - é sugestivo e atraente para o guitarrista. Embora se trate de um amplificador essencialmente solid state, pois a maior parte de seu circuito usa transistores, o Tube One possui uma válvula 12AT7 no preamplificador, a qual produz a bem-amada distorção, essencial a muitas formas de música.
O Tube One possui dois canais, selecionáveis a partir do painel ou mediante um pedal incluído. O canal Clean (limpo) apresenta um pré de grande dinâmica, capaz de aceitar virtualmente qualquer estilo ou instrumento sem distorcer ou apresentar ruído. Mesmo usando a minha velha Gibson, com captadores com ímã de Alnico V que saturam facilmente um pré-amp mais delicado, não notei nenhuma dificuldade por parte deste combo em suportar as mais rudes porradas. O equalizador (graves, médios e agudos) foirealmente projetado para guitarra, com freqüências de atuação muito eficazes. É fácil timbrar o Tube One, chegando-se inclusive perto da sonoridade de um Fender, se tivermos o cuidado de experimentar com os controles. Para completar, existe no canal Clean a chave Bright que, como o nome indica, acrescenta mais brilho (agudos extremos) ao timbre.
O canal Over é radicalmente diferente do Clean. Neste canal, temos a chave Turbo, que acrescenta ainda mais ganho ao pré em freqüências médias e baixas. É tão alto este ganho, que mesmo a volumes relativamente moderados conseguimos obter sustain infinito em qualquer nota tocada.
Ainda no canal Over, temos no equalizador um controle adicional, o Contour. De efeito surpreendente, o Contour muda radicalmente o timbre do amp à medida que é girado. Totalmente à esquerda, corta os médios e cria aquele timbre "thrash", ideal para se fazer bases de heavy metal. Na posição central, o timbre fica neutro. Na posição entre o centro e a extrema direita, temos um reforço acentuado de médios, ideal como timbre "Lead"  permite sustains incríveis, bem ao estilo de Brian May com seu velho amp Vox "no talo". Na extrema direita, os agudos são atenuados e os médios e graves sobressaem, transformando o Tube One num amplificador para "jazz sujo".
O ganho é tão alto, que mesmo com o Turbo desligado e o ganho no mínimo, o pré ainda satura. Para os donos de guitarras com captadores potentes, isso é inconveniente, pois é impossível tocar totalmente "limpo" neste canal. Na minha opinião, para compensar isto a Staner bem poderia incluir um controle Contour no canal Clean também.

Efeitos
O processador digital oferece sete presets fixos, o que não constitui problema, pois os efeitos são bem escolhidos e vêm com parâmetros convenientemente ajustados. Existem dois contro-les de ganho, sendo um para a entrada e outro para a saída do processador de efeitos. Estes controles permitem otimizar o nível de operação do DSP, evitando num extremo o ruído excessivo, e no outro a distorção.
Temos dois tempos diferentes de reverb, com pre-delay proporcional; três tempos e estilos diferentes de eco; chorus e flanger. O eco curto é ótimo para criar uma sensação de ambiente, ou então para tocar rock'n'roll tradicional; o eco mais longo pode ser usado para solos, funcionando muito bem em conjunto com o overdrive. O reverb longo se assemelha bastante ao "clássico" reverb de mola, apreciado por todos os guitarristas. Os outros efeitos são interes-santes, mas o fato de não terem parâmetros ajustáveis limita sua utilidade.
Para quem não ficou satisfeito com os efeitos incluídos, o Tube One inclui, no painel traseiro, um loop de efeitos, com dois jaques P10.

Um Bom Pré para Gravação
No painel traseiro do Tube One, há dois conectores XLR macho, que permitem a gravação direta (sem microfonar). Com os ótimos pré-amps de que o aparelho dispõe, seria - embora um desperdício - interessante poder desligar os estágios de potência e utilizar o Tube One como pré para gravação (veja artigos nas duas edições anteriores, sobre gravação de guitarra).
É importante assinalar que estas saídas são filtradas para simular a resposta típica de um amp de guitarra, portanto pouca ou nenhuma equalização é necessária na mesa para a simulação.

Amplificação de Potência
O Tube One possui dois amplificadores de potência de 65 watts RMS, cada qual conectado a um alto-falante Staner de série especial, de 12". O alto-falante esquerdo reproduz o sinal "seco" (sem efeitos) e o direito reproduz os efeitos. O mesmo se dá com os dois conectores XLR do painel traseiro.
Isto desperdiça um pouco a potência de saída, mas, especialmente quando se usa o reverb ou o eco longo, o efeito estéreo obtido é bonito.
Além dos bons controles de tonalidade, que permitem boa gama de variação do timbre, são dignos de nota os dois alto-falantes que equipam o Tube One, especialmente desenvolvidos para guitarra. Segundo Renato Silva, Presidente da Staner, "o projeto do Tube One começou pelos alto-falantes". Eles têm altíssima eficiência, a indispensável resposta moldada nos médios, e "sujeira" na dose ideal.

Medições
Talvez medições técnicas não signifiquem muito para o guitarrista médio, que busca potência e timbre - que, aliás, não faltam ao Tube One. Porém, para os mais técnicos, afinal será interessante conferir os parâmetros que caracterizam um bom amplificador de instrumento.

Resposta de Freqüências
Dois tipos de levantamentos foram feitos: eletrônico e acústico. A medida eletrônica foi feita na saída de gravação de som "seco", tanto para o canal Clean quanto para o Drive, em vários ajustes dos respectivos equalizadores. O levantamento acústico foi feito de duas formas diferentes: com o microfone no eixo do alto-falante, e 45° fora de eixo, sempre a cerca de 30 centímetros de distância da frente do amp, como é prática ao se microfonar este equipamento; em ambos os casos, foi usado o canal Clean com os controles de equalização na posição central.
A resposta "eletrônica" do canal Clean é mostrada, a seguir. Vemos as variações introduzidas pelos controles de graves (Low), médios (Mid) e Agudos (High) em suas posições mínima, central (flat) e máxima. A resposta do Tube One é corretamente timbrada, ou seja, nunca é plana como num amp de potência comum. Isto é que acrescenta o charme característico do som da guitarra. Por exemplo, a queda suave em torno de 500Hz é que dá o "timbre de madeira" (wooden tone), característico dos amplificadores Fender. Por outro lado, a subida em torno de 3500Hz acrescenta volume e "presença" ao som do instrumento, fazendo-o sobressair do resto da banda.



 



 
Note também que os controles de graves e de agudos atuam em freqüências bem mais próxi-mas dos médios do que as de um equalizador comum, para que atuem bem dentro da região do áudio atingida pela guitarra.
A chave Bright atua reforçando os agudos extremos.
No canal Drive, os controles de equalização atuam de forma diferente do canal Clean, o que demonstra a preocupação do time de projetos da Staner com o timbre de seu amp. Vemos, a seguir, as atuações dos controles de tonalidade do canal
Drive.







Veja também a ação do controle Contour. Em sua posição central, oferece um timbre neutro (em se tratando de guitarra, é claro). Girando-se o botão para a esquerda, vai-se produzindo uma atenuação cada vez maior em 750Hz, atingindo-se no extremo esquerdo da rotação um corte de mais de 7dB. Girando-se o controle um pouco para a direita, obtém-se um reforço de cerca de 4dB em 700Hz, que acrescenta enorme "punch" ao som distorcido. Surpreendentemente, ao se atingir o extremo direito da rotação, o timbre muda radicalmente, tornando-se velado, com uma atenuação de quase
12dB em 5kHz.


Finalmente, o canal Drive dispõe da chave Turbo, que aumenta em cerca de 7dB o ganho em graves, efeito que vai se reduzindo acima de 1kHz, até reforçar apenas cerca de 1dB a partir de 2kHz. Este controle, quando acionado, torna
máximo o efeito de feedback.



A resposta de freqüências medida acusticamente (com microfone) guarda muito do aspecto da curva medida em linha - o que comprova o cuidado em oferecer uma saída para gravação realmente utilizável, na medida em que emula o timbre característico. Temos a mesma queda em 500Hz (o som "de madeira") e reforço de cerca de 8dB nas médias-altas, que com o falante microfonado no eixo, se estende até 5kHz. Com o microfone a 45° fora de eixo, o reforço de médios-agudos se suaviza, ficando a resposta aproximadamente plana desde 1kHz até 6kHz, caindo rapidamente acima deste ponto.

 

Ao se gravar o Tube One com microfone, vale a pena gastar algum tempo escolhendo o ângulo ideal para captar toda a beleza de seu timbre.

Distorção
A medida de distorção, conforme seja feita no canal Clean ou no Drive, tem objetivos bem diferentes. No canal Clean, queremos averiguar o quão baixa é a distorção. Já no canal Drive, onde a distorção alta é o ideal, queremos investigar de que harmônicos ela se compõe.
Uma guitarra com captador single coil típico pode chegar a fornecer, quando tocada com muita força, cerca de 100mV em sua saída. Com captador humbucking, essa saída pode chegar a mais de 200mV. Usando o canal Clean, medimos a distorção harmônica total (THD) com o nível de entrada variando desde 56mV (-25dBV) até 1V (0dBV). Obtivemos uma leitura de 1% a 100mV, de 1,5% a 200mV, subindo gradativamente até atingir 8% com 1V na entrada. Este é o comportamento típico de uma válvula.
Usando-se o canal Drive no máximo ganho e com Turbo ligado, a THD atingiu nada menos de 42%! Porém, curiosamente, essa distorção é composta apenas de harmônicos ímpares, um comportamento tipicamente associado a transistores e não a válvulas operando em classe A.
A resposta ao toque (ou seja, o controle da intensidade da distorção pelo volume gerado no instrumento) poderia ser melhorada, permitindo ao músico tocar "clean" reduzindo o volume da guitarra, ou tocando-a suavemente... ou fazer o Tube One rugir quando batesse forte nas cordas.
De qualquer maneira, o Tube One é excelente para se tocar leve, no canal Clean, ou pesado no canal Drive. O timbre de overdrive é realmente pesado, e não traz muitos harmônicos altos, o que se traduz num timbre gostoso e estimulante.

 

Equipamento de Teste
Analisador de Áudio Neutrik A2D, com software AS04
Software Sound Technology SpectraLab 4.32.17
Microfone calibrado Neutrik 3382
Computador HP Omnibook Pentium III 500 MHz
Guitarras Fender Stratocaster e Gibson ES335

Conclusão
O Staner Tube One tem 100% de chance de se tornar mais um sucesso da Staner. Agradará a muitos guitarristas, de todos os estilos. Seu timbre Clean é "clean" mesmo, seu overdrive é "gordo", o sustain é incrível, os equalizadores são excelentes - com destaque para o Contour - e os alto-falantes falam bonito. Os efeitos, apesar de fixos, são interessantes, e as saídas para gravação são realmente úteis.
Como sugestões: incluir o Contour no canal Clean e melhorar a resposta ao toque do canal Drive.

 

Sólon do Valle, editor técnico de M&T, é consultor e projetista em Áudio.

 

 
 
Conteúdo aberto a todos os leitores.