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Revista Luz & Cena
Áudio básico
Microfonação - Parte 1
Técnica a Serviço do Forró
Fábio Henriques
Publicado em 13/06/2005 - 00h00
Vamos iniciar uma série de artigos abordando técnicas de microfonação, equalização e mixagem para os mais diversos instrumentos. Procurarei exemplificar sempre com alguma gravação que já tenha feito para que os leitores possam verificar os resultados. Para começar, vamos dar uma olhada em um instrumento que tem estado muito em evidência graças ao sucesso do forró: a zabumba.


Microfonando a Zabumba


A zabumba é tocada na pele superior com uma maceta parecida com a do pedal de um bumbo e na pele superior com uma vareta de madeira fina chamada bacalhau. Para se gravar em estéreo, recomendo o uso de um microfone para a pele superior e outro para a inferior, de acordo com a figura 1. Ambos podem ser dinâmicos ou condensadores, dependendo da agressividade desejada. Lembre-se de inverter a fase de um dos canais na mesa.
A posição do microfone superior deve ser encontrada de acordo com o instrumento, embora na maioria das vezes você vá acabar mesmo colocando o microfone a uns 30cm da pele, apontando para uma região na metade da distância entre o centro e a borda da pele.
O microfone inferior deve ficar um pouco mais afastado, pois os níveis alcançados pelo bacalhau são muito altos. Costumo dar preferência, neste caso, aos microfones condensadores de diafragma pequeno. Cuidado para que o microfone não atrapalhe a performance do músico. No CD É Tudo 1 Real, de Pedro Luis e a Parede, para aumentar a agressividade do som, usamos um microfone dinâmico de baixo custo preso ao instrumento. Pode-se ter uma idéia do som obtido pelo apelido carinhoso que este microfone recebeu: "pato rouco".
Quanto à equalização, no canal do bacalhau pode-se dispensar os graves e as médias-baixas. Eventualmente, será vantajoso um pequeno realce nas médias-altas. No canal da maceta, você vai notar que a zabumba apresenta uma certa rebeldia sonora, com harmônicos não muito consonantes nas médias-médias. Evite embelezar demais, pois esta aspereza é que dá o som característico ao instrumento. Quando se arruma demais a equalização da zabumba, ela acaba ficando com som de tom-tom de bateria, o que certamente não é o desejado.
Na mixagem, evite o desejo de se puxar demais os graves, pois a zabumba não é o bumbo de uma bateria. Sua fundamental soa bem acima, por volta de 150 a 300 Hz. Acentuar os graves só trará ruídos.
Quanto à colocação no estéreo, se chegou para você uma zabumba gravada em mono, você pode tentar separar os sons da maceta e do bacalhau. O jeito mais simples é separá-los através da equalização. O resultado não é lá muito bom porque se perde muito do ataque no canal da maceta. Uma técnica mais eficiente e muito mais complicada foi a que usei no tributo a Luiz Gonzaga - Duetos com Mestre Lua. Vou descrevê-la admitindo o uso de um sistema ProTools, mas nada impede que seja usada em sistemas analógicos. Para começar, copiamos o canal da zabumba original para um outro. O primeiro será o canal da maceta e o segundo o do bacalhau. Equaliza-se este último deixando apenas as médias-altas para que só o bacalhau soe. Agora, fazemos uma mandada deste canal para um bus, habilitando-a como pre-fader. No canal da maceta, inserimos um compressor - por exemplo, o d3 da Focusrite. Colocamos o attack e o release em seus valores mínimos e a ratio no máximo (10:1) e, a seguir, habilitamos o sidechain (clicando na "chavinha") e colocamos como entrada do sidechain o bus usado acima. Pronto, agora toda vez que o bacalhau tocar, o compressor irá abaixar violentamente o volume do canal da maceta. Assim conseguimos isolar os dois sons - o bacalhau através da equalização e a maceta pela compressão (este tipo de compressão é chamado de ducking). Veja a figura 2.

 


Microfonando a Sanfona


Muita gente usa o jeito mais clássico de se microfonar a sanfona em estéreo, que é colocando-se um microfone para captar o teclado e outro para o lado dos baixos. Embora amplamente utilizada esta configuração tem uma séria desvantagem. O lado que capta o teclado, normalmente, fica muito favorecido e o estéreo fica completamente desbalanceado. Um fator que atrapalha mais ainda é que enquanto o lado do teclado fica normalmente parado, a distância do lado dos baixos até o microfone varia constantemente por causa dos movimentos do fole.
Uma opção para deixar o estéreo mais bem comportado é juntar um pouco mais os dois microfones, podendo-se usar por exemplo a técnica X-Y (dois cardióides a 90º) ou um microfone estéreo. Neste caso, os microfones devem ficar um pouco mais afastados do instrumento para evitar o favorecimento de algumas notas.
A melhor técnica, na minha opinião, é a que me foi ensinada por Guilherme Reis, que consiste em usar um par de microfones condensadores iguais (dois AKG 414, por exemplo) com captação cardióide, montados um acima e outro abaixo da sanfona, a uma distância de 60 a 80 cm, os dois apontados exatamente para o centro do instrumento. Nesta situação, a captação no sentido horizontal é idêntica para ambos os microfones e o efeito estéreo é comandado pela diferença de emissão, pois algumas notas e/ou seus harmônicos projetam mais para cima e outras mais para baixo. O efeito é rico e ao mesmo tempo equilibrado. As sanfonas que gravei no disco Hoje e Amanhã, de Geraldo Azevedo, foram microfonadas assim.
Na mixagem, deve-se tomar cuidado pois a sanfona atua numa região semelhante à da voz. É recomendável ajustar a equalização de acordo com o timbre do cantor. Um efeito bem interessante é o chorus, que realça bastante a riqueza harmônica deste instrumento.


Microfonando o Triângulo

Ao contrário do que se faz em música pop, não se deve cortar demais as médias e médias baixas do triângulo de forró, uma vez que são elas que dão o som característico e o reforço rítmico. Use um condensador de diafragma pequeno e dê uma certa distância (40 a 80 cm, dependendo da intensidade com que é tocado), tomando cuidado para que o microfone não sature.

Microfonado o Pandeiro

Aproveitando a oportunidade vamos incluir nesta análise o pandeiro e sua prima, a pandeirola. O pandeiro, apesar de pequeno e aparentemente limitado, apresenta grandes possibilidades tímbricas e pode ser usado em diferentes estilos musicais.
Na captação clássica de samba, por exemplo, usa-se um dinâmico (Sennheiser 421, por exemplo) por baixo do instrumento a uma distância de mais ou menos 40cm. Para outros estilos pode-se inverter a posição do microfone, passando a captar-se por cima.
Para situações onde o pandeiro terá maior destaque, pode-se captá-lo em estéreo. Minha configuração preferida é parecida com a já apresentada para a zabumba (Figura 3), porém neste caso os microfones precisam ser necessariamente do mesmo modelo (prefiro os condensadores de diafragma pequeno como o Neumann KM-184 ou o Shure SM81). Deve-se, da mesma forma, antes inverter a fase de um deles e também procurar colocá-los de maneira que o pandeiro esteja na metade da distância entre eles. Cuidado para não limitar os movimentos do músico. Para isso coloque os microfones a pelo menos 60cm de distância do instrumento. Este trabalho todo no posicionamento acaba compensando, pois se tudo correr bem, você obterá o grave do instrumento bem no centro do estéreo enquanto haverá um movimento interessante dos agudos pelo eixo L-R porque os movimentos do músico ao tocar farão com que as platinelas e a parte mais média alta da pele se mova correspondentemente entre as caixas.
No caso em que o pandeiro é o instrumento principal, pode-se sofisticar ainda mais a captação. Por exemplo, no CD Afrosick, do japonês Miyazawa, captei o pandeiro de Marcos Suzano usando cinco microfones. Além do par acima descrito, havia um SM98 que Suzano usa normalmente preso ao instrumento, captando por baixo e um par de Earthworks omni colocados a 3m de altura e afastados 2,5m um do outro, apontados para o chão. Com isso foi possível captar toda a gama de sons que Suzano tira de seu instrumento, pois o SM98 proporcionava os graves, o par estéreo ficou responsável pelos médios no centro e agudos nas pontas e o par de omnis forneceu a ambiência e um pequeno delay que conferiu a naturalidade necessária ao som final.
Quanto à pandeirola, deve-se tomar cuidado com duas coisas. Primeiro este som satura o microfone com muita facilidade, podendo atingir níveis bem altos, principalmente em gravação digital. O segredo aqui é afastar o microfone, de acordo com a intensidade do som e com as características da sala. Costumo usar mais ou menos uns 80cm de distância quando a sala não é muito reverberante.
O outro problema é a diferença entre as batidas mais altas (quando se bate a pandeirola na outra mão) e as mais baixas (quando apenas se sacode o instrumento). Normalmente, os compressores não são velozes o suficiente para diminuir esta diferença (valvulados nem pensar). Recomendo os plug-ins de limitadores como o Maxim, da Digidesign, e o L1, da Waves.


No próximo mês vamos falar, entre outras coisas, sobre microfonação de amps de guitarra e de violões de aço e nylon.



Fábio Henriques é engenheiro eletrônico e engenheiro de gravação, trabalhando no Discover Studio. www.discoverstudio.com.br. E-mail: fabhenr@openlink.com.br

 
 
Conteúdo aberto a todos os leitores.