Neste mês vamos iniciar uma série sobre os diferentes instrumentos do Live, para conhecermos melhor cada um e descobrir as possibilidades sonoras que o software tem a nos oferecer. É importante frisar que nem todos os instrumentos estão inclusos no pacote básico do Live (somente o Simpler e o Impulse). Já o pacote Suite contém todos esses instrumentos, e, por isso, vale muito a pena. Nesta edição, por ordem alfabética, começamos com o Analog!
É importante frisar que eu abordarei somente os controles e parâmetros encontrados no instrumento e como utilizá-los. Infelizmente não teremos espaço aqui para a parte teórica de síntese, e nem para explicar como criar timbres "do zero". A ideia aqui é que a grande maioria das pessoas irá partir de um preset de fábrica e somente precisará ajustar os parâmetros para se adequar à sonoridade desejada. O que eu posso sugerir, para quem quiser ir além, é experimentar bastante com os controles e parâmetros e "estudar" os presets que vêm com o próprio instrumento (neste caso, o Analog). Procure um timbre que você ache interessante nos presets e disseque-o, analisando cada controle e parâmetro até entender porque foi utilizado dessa maneira. Essa é uma excelente forma de "aprender" a criar timbres diferentes. Repetindo isso diversas vezes, logo você terá noção suficiente para poder criar seus próprios timbres "do zero".
O QUE É?
O Analog é um sintetizador virtual que não tenta emular (ou copiar) nenhum dos sintetizadores analógicos tradicionais, e sim unir diversas funções e características dos sintetizadores clássicos em um único instrumento moderno. Os sons são gerados através da modelagem física, que simula os componentes presentes no sintetizador a partir de um modelo baseado em seus parâmetros individuais. O Analog não utiliza nenhum tipo de sample ou wavetable, ou seja, nenhum som pré-gravado. Para gerar os sons, diversos cálculos matemáticos, que descrevem como os circuitos funcionam, são resolvidos em tempo real pelo computador, de acordo com os valores dos parâmetros selecionados. Com isso, é possível recriar timbres e efeitos de maneira muito fiel, mas com maior maleabilidade da sonoridade, pois todos os parâmetros são ajustáveis (o que não ocorre em sintetizadores que utilizam samples).
ARQUITETURA
O Analog dispõe de dois osciladores e um gerador de ruído (noise generator), que podem ser roteados de forma independente para dois filtros configuráveis, que estão conectados a amplificadores. O sinal dos osciladores pode ser enviado aos filtros em série ou em paralelo, permitindo grande flexibilidade sonora. O Analog ainda dispõe de dois LFOs (osciladores de baixa frequência), que podem ser utilizados para modular os osciladores, filtros e amplificadores. Além disso, cada filtro e amplificador dispõe de um gerador de envelope.
INTERFACE
A interface do Analog consiste em duas partes: o Display e o Shell (ou casca, em inglês). O Shell contém os controles principais de cada seção, enquanto o Display é atualizado para exibir os parâmetros e controles adicionais da seção selecionada (o que é feito clicando sobre a mesma). Há também a seção Global, que contém os controles e parâmetros gerais de performance, como volume, vibrato e polifonia.
OSCILADORES
Os dois osciladores recriam, através da modelagem física, o som e as características dos osciladores eletrônicos clássicos, o que evita certos artefatos indesejáveis, como aliasing (quando frequências altas acabam sendo interpretadas como harmônicos mais baixos). Cada oscilador pode ser ligado ou desligado de forma independente através dos botões Osc 1 e Osc 2 encontrados no Shell. O nível na saída de cada oscilador é controlado pelo fader à direita de cada botão. Abaixo de cada um desses há outro fader (F1/F2), que controla o equilíbrio do nível na saída de cada oscilador enviado para os dois filtros. O primeiro número representa a porcentagem destinada ao filtro 1 (F1), enquanto o segundo indica a porcentagem destinada ao filtro 2 (F2).
O menu Shape define a forma de onda utilizada pelo oscilador. As opções são: seno, dente-de-serra, retangular, e ruído branco (veja imagem). Quando a forma de onda retangular for escolhida, é possível definir a largura do pulso (pulse width) através do controle Width no Display (é necessário selecionar o oscilador desejado clicando sobre o mesmo). Com valores mais baixos, a sonoridade fica "menor", com som "de lata", enquanto a 100% a onda será perfeitamente "quadrada" e contendo somente os harmônicos ímpares. A largura do pulso também pode ser modulada pelo respectivo LFO, no controle ao lado (LFO 1/2), que só será acionado quando o respectivo LFO for ligado.
Formas de onda
Todo oscilador utiliza alguma forma de onda em seu movimento, e cada forma de onda produz uma sonoridade diferente. A escolha da forma de onda é essencial na criação de um timbre, e por isso é importante conhecer as formas mais comuns:
- Sine (seno): A onda mais pura, pois não contém harmônicos, somente a frequência fundamental. Tem um som "doce" (tipo flauta).
- Square (retangular): Contém somente os harmônicos impares e tem um som "oco".
- Sawtooth (dente-de-serra): A mais completa das formas de onda, pois contém harmônicos ímpares e pares.
Os controles Octave, Semi e Detune controlam a afinação em oitavas, semitons e centésimos de semitom, respectivamente. A afinação também pode ser modulada através dos controles Pitch Mod e Pitch Env encontrados no Display (quando o oscilador desejado estiver selecionado). O controle LFO (1 ou 2) controla a intensidade que o respectivo LFO irá modular a afinação do oscilador selecionado (somente se o LFO estiver ligado).
O controle Key define o quanto a nota do teclado influencia a afinação, com 100% sendo o padrão internacional de um semitom entre notas. Se o valor for superior ou inferior a 100%, o sintetizador soará "desafinado", o que pode ser utilizado para efeitos e timbres "estranhos". Em 0%, a afinação será a mesma, independentemente da nota executada. Vale a pena experimentar com os osciladores em valores diferentes. Uma combinação que costuma funcionar bem é utilizar um oscilador em 100% e o outro com um valor um pouco diferente.
Os controles Pitch Env permitem criar uma "rampa" que modulará a afinação do oscilador ao longo do tempo. O controle Initial determina a afinação inicial da nota, com valores acima de 0% sendo mais agudos e valores negativos sendo mais graves que a nota original. O controle Time controla o tempo levado para a afinação chegar até o seu estado original. À esquerda dos controles há um gráfico que representa essa modulação, e, inclusive, é possível ajustar os valores de ambos controles (Initial e Time) arrastando os quadrados amarelos no gráfico.
Os controles Sub/Sync no Display permitem acrescentar um sub-oscilador ou um oscilador em "hard sync". Com a forma de onda em seno, somente a opção Sub (sub-oscilador) estará disponível, enquanto com a forma de onda em dente-de-serra ou retangular é possível selecionar uma das duas opções. Com a forma de onda em ruído branco, nenhuma das duas opções estará disponível.
Em Sub, um sub-oscilador é inserido no sinal uma oitava abaixo do oscilador original, para reforçar o grave. Quando a forma de onda do oscilador original estiver em seno, o sub-oscilador também atuará com uma forma de onda em seno. Quando a forma de onda estiver em dente-de-serra ou retangular, a forma de onda utilizada no sub-oscilador será retangular. O controle Level determina o nível do sub-oscilador presente no sinal.
Em Sync, um novo oscilador é inserido para controlar os ciclos do oscilador original. Os ciclos do oscilador original são sincronizados aos ciclos do novo oscilador ("hard sync"), e toda vez que um ciclo se inicia no novo oscilador, o oscilador original é disparado do início novamente. O controle Ratio determina a diferença de afinação entre os dois. Em 0%, os dois atuam na mesma frequência, e nenhuma diferença será notada. Porém, com valores acima de 0%, o novo oscilador passa a atuar em uma frequência acima do oscilador original, gerando formas de onda irregulares, que permitem criar sonoridades bastante ricas.
GERADOR DE RUÍDO
O gerador de ruído do Analog produz ruído branco (white noise) para ser acrescido ao sinal, e inclui o seu próprio filtro passa-baixa (-6 dB/oitava), que permite filtrar os agudos. O gerador pode ser ligado e desligado através do "botão" Noise no Shell. O fader à direita permite ajustar o nível do ruído no sinal. Abaixo, há outro fader (F1/F2) que controla o equilíbrio do nível de ruído a ser enviado para os dois filtros. O primeiro número representa a porcentagem destinada ao filtro 1(F1), enquanto o segundo indica a porcentagem destinada ao filtro 2 (F2). O controle Color permite ajustar a frequência de corte do filtro passa-baixa.
FILTROS
Os dois filtros são equipados com diversas opções de roteamento, modulação e saturação. E assim como os osciladores, todos os parâmetros dos filtros podem ser ajustados de forma independente para cada um dos filtros.
Os botões Fil 1 e Fil 2 no Shell permitem ligar e desligar os filtros 1 e 2, respectivamente. Os menus à direita desses botões permitem escolher o tipo de filtro a ser utilizado. Os tipos são: LP12 (passa-baixa 12 dB/oitava), LP24 (passa-baixa 24 dB/oitava), BP6 (passa-banda 6 dB/oitava), BP12 (passa-banda 12 dB/oitava), N2P (notch com dois pólos), N4P (notch com quatro pólos), HP12 (passa-alta 12 dB/oitava), HP24 (passa-alta 24 dB/oitava), F6 (formante [para sons de vozes] com dois pólos) e F12 (formante [para sons de vozes] com quatro pólos).
A frequência de corte do filtro é determinada pelo controle Freq no Shell, enquanto o controle Reso determina a intensidade de ressonância do filtro. Quando um filtro "formante" for selecionado, o controle Reso irá modificar a "vogal" utilizada.
Abaixo dos menus de filtro há dois controles que diferem entre os dois filtros. No filtro 1, o controle To F2 determina a quantidade do sinal na saída do filtro 1 que será enviado para a entrada do filtro 2. Já no filtro 2, o botão Slave determina que a frequência de corte do filtro 2 será controlada pela frequência de corte do filtro 1. Com isso, o controle Freq do filtro 2 passará a controlar somente a diferença entre as frequências de corte dos dois filtros. Atuando nesse modo, qualquer modulação aplicada à frequência de corte do filtro também afetará a frequência de corte do filtro 2.
Quando um dos filtros é selecionado (clicando sobre o mesmo), o Display passa a exibir os controles relacionados ao filtro escolhido. Há diversos controles, incluindo os controles de envelope (que falaremos mais adiante) e os de modulação e distorção. Os controles Freq Mod e Res Mod permitem ajustar o controle dos LFOs sobre a frequência de corte e ressonância, respectivamente. LFO (1 ou 2) determina a influência do LFO (1 ou 2) sobre a frequência de corte ou ressonância do filtro. Valores positivos aumentam, enquanto valores negativos diminuem os controles de frequência de corte e ressonância dos filtros. Os controles Key ajustam a influência da nota tocada sobre a frequência de corte e ressonância. Com valores positivos, quanto mais aguda for a nota tocada, mais alto será o valor da frequência de corte ou ressonância. Com valores negativos, quanto mais aguda for a nota tocada, mais baixo será o valor da frequência de corte ou ressonância.
O menu Drive permite escolher um tipo de distorção (ou saturação) a ser aplicado à saída do filtro. Há dois tipos de distorção: Sym (simétrico) e Asym (assimétrico), com três intensidades diferentes (1-3/menor-maior). A opção Off desliga a distorção.
O papo tá bom, mas vamos parando por aqui... Na próxima edição terminaremos de falar sobre o Analog, mas já dá pra perceber que é um sintetizador bem interessante, não é? Então não percam!
Mês que vem tem mais. Até lá!
Lucas Ramos é tricolor de coração, engenheiro de áudio, produtor musical e professor do iatec.
Formado em engenharia de áudio pela Sae (School of audio engineering), dispõe de certificações oficiais como pro tools certified operator, apple logic certified trainer e ableton live certified trainer.
e-mail: lucas@musitec.com.br