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Revista Luz & Cena
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Brincadeira de adultos
Pato Fu leva para a estrada seus instrumentos de brinquedo
Rodrigo Sabatinelli
Publicado em 09/01/2012 - 13h58
Felipe Mafra
 (Felipe Mafra)
Em julho de 2010, os mineiros do Pato Fu lançaram de forma independente o álbum Música de Brinquedo. Registrado no 128 Japs, estúdio que John Ulhoa e Fernanda Takai, líderes da banda, mantêm em casa, no bairro da Pampulha, Belo Horizonte, o trabalho transportou o grupo - que conta, ainda, com Xande Tamietti, Ricardo Koctus e Lulu Camargo - para o universo infantil. Afinal de contas, como sugere o nome do álbum, todas as canções gravadas para o projeto foram tocadas com instrumentos de brinquedo ou miniaturas.

Com um repertório baseado exclusivamente em standards da música nacional e internacional, como Primavera (Vai chuva), sucesso na voz de Tim Maia; Frevo Mulher, de Zé Ramalho; Live And Let Die, de Paul McCartney; Ovelha Negra, de Rita Lee; Sonífera Ilha, dos Titãs, e Ska, dos Paralamas, o disco foi parar na estrada e ganhou público e crítica numa só tacada. Não surpreendentemente, foi registrado em DVD, num show realizado no Auditório do Ibirapuera, em São Paulo.

Em recente passagem pelo Rio de Janeiro, quando o Pato Fu se apresentou no projeto SESI Bonecos do Mundo 2011, realizado no Aterro do Flamengo, o engenheiro de áudio João Libarino, responsável pela operação do PA da banda, conversou com a AM&T. No bate-papo, repleto de gargalhadas e informações técnicas, ele revelou detalhes sobre a captação dos instrumentos de brinquedo ao vivo, bem como as adaptações que foram feitas neles e as principais dificuldades em mixar o som de um show tão específico quanto este em um local a céu aberto.

DO ESTÚDIO PARA A ESTRADA

Muitos dos microfones utilizados em estúdio, durante a gravação do disco, foram levados para a estrada. O motivo: fazer com que o som das apresentações fosse o mais próximo possível do que fora gravado no 128 Japs. Porém, para determinados casos, foram feitas algumas modificação. "No bumbo da bateria do Xande, por exemplo, diferentemente do que foi feito na gravação do disco, nos shows eu trabalho com o AKG D 112 em sua parte externa e com o AKG C 418 em seu interior. O resultado é um som mais vivo", conta Libarino.

A caixa "milho" é captada por um AKG C 3700, e o bongô, que tem o som reproduzido por um pequeno alto-falante de celular, recebe um C 418, enquanto tons e pratos são captados por dois AKG C 3000. Como a caixa vaza muito no bongô, que fica exatamente abaixo dela, é preciso lançar mão de compressão em seu canal. "Um pouquinho de nada, só para segurar o ataque. O resto fica 'soltinho' mesmo", diz o engenheiro.



Xande também toca dois objetos que são adaptados para soar como instrumentos. Um deles é um Pogobol, que tem um microfone de contato instalado em seu kick para soar a cada batida do músico. O outro é um enorme João Bobo, que faz parte do cenário do espetáculo. "Este elemento inflável recebe cerca de seis litros de água para soar ainda mais grave a cada baquetada do Xande, como se fosse um surdão de escola de samba. Ele também é captado por um microfone de contato, preso à meia-altura por uma fita especial", diz Libarino.

O minibaixo de Ricardo Koctus, que usa um encordoamento semelhante ao dos baixos tradicionais, não passa por nenhum tipo de amplificação e segue em linha para o PA. Quando não está tocando o instrumento, o músico tira sons de uma minicalimba, captada por um microfone de contato plugado a um direct box ativo para valorizar os graves.


Em seu setup, Fernanda Takai conta com instrumentos de diversos tamanhos e origens. Há um violão acústico, que também usa um captador interno, uma caixinha de música, captada por um microfone de contato, e muitos brinquedinhos de sopro, como apitos, um saxofone MIDI, uma vaquinha que emite mugidos e um sapinho sonoro, todos captados pelo microfone de voz da cantora, um Shure SM87 Beta A.

John é, dentre os músicos, o que toca um número maior de instrumentos. No show, ele usa uma miniguitarra, um miniviolão e um cavaquinho. Todos esses instrumentos passam por sua pedaleira, composta por diversos pedais de efeitos, e, principalmente, pelo pedal Fishman Aura, que, de acordo com Libarino, simula microfonação de instrumentos de corda.

"O Aura dá um 'corpo', um volume interessante no som destes instrumentos, que, por serem miniaturas, soam menos do que os instrumentos tradicionais. Mas o mais interessante de tudo é que o pedal gera até microfonia nesses mini-instrumentos", diz.



Outros "brinquedinhos" utilizados pelo músico, que usa um AKG C 900 para cantar e se comunicar com a plateia, são o drawdio, um lápis que tem um circuito de teremim acoplado a seu corpo; uma cobra de plástico, que emite sons ao ser rodada no ar; uma pistolinha, que faz barulhos similares aos de uma espaçonave, e, claro, muitos apitos.

O tecladista Lulu Camargo usa, basicamente, um minipiano de armário, de três oitavas, que é captado por um AKG C 414 posicionado em sua parte traseira, e uma escaleta, também captada por este microfone, já que é posicionada no tampo do piano. Dentro da caixa do piano há, ainda, um Shure SM58, que ao ser mixado juntamente com o 414, chega a 20% no PA. Em alguns momentos do show, Lulu usa um metalofone, que, por sua vez, é captado por um AKG C 1000.

Convidados para acompanhar o Pato Fu na estrada, os músicos Thiago Braga e Mariá Portugal têm à disposição o que Libarino chama de "mesa de atividades". Nela podem ser encontrados xilofones, escaletas, miniacordeons, saxofones, ukelelês e apitos, entre muitos outros instrumentos.


Um microfone AKG C 480 serve ao xilofone enquanto um SM58 capta os apitos tocados por Mariá e um C 1000 capta o sax de Thiago. Um bumbo de bateria, que foi transformado em um tambor, é tocado pelos músicos. Ele é captado por um microfone de contato, assim como outras calimbas. Já os C 418, de clamp, servem a diversas peças, entre elas um pequeno elefante que emite sons, um carro de polícia e um bongô. Além dos bibelôs, a dupla usa três teclados em miniatura ligados em linha.

Ao fundo do palco, escondidos em parte do cenário, dois manipuladores de marionetes fazem vozes de apoio, usando, para isso, headsets. Um deles, inclusive, toca uma pequena zabumba, captada por microfones de contato ligados a um DI ativo.



CORTE DE FREQUÊNCIAS NAS ALTAS

Libarino revela que muitos dos instrumentos usados no projeto Música de Brinquedo são "agressivos", pois têm por característica excesso de médios e agudos na emissão de seus sons. "Alguns chegam a irritar. É o caso das guitarrinhas, dos pianos e do metalofone", diz ele, que para minimizar o problema promove cortes nestas frequências. "Pouca coisa, só para ajustá-los dentro da base na mixagem."

Mas engana-se quem pensa que Libarino promove os ajustes de frequências diretamente nos microfones. De acordo com ele, em vez disto, os cortes são feitos no próprio sistema. "Procuro manter os microfones flats, logo deixo para modificar o som do PA. O piano e os bongôs são 'cortados' nos filtros da própria mesa, geralmente uma Avid Venue ou uma Yamaha PM5D", explica.

Compressão é um efeito que Libarino não tem como abrir mão em um show desses. Em muitos dos instrumentos, serve como limiter, enquanto nas vozes de Fernanda e Mariá é usado como ganho. E se os compressores são largamente usados, delays e gates, muito comuns em shows ao vivo, são deixados de lado. "Mas não os reverbs. Esses eu também não abro mão. Nas apresentações, uso três tempos diferentes, sempre no intuito de amaciar o som", diz o técnico.

VENTO: INIMIGO NÚMERO 1

É mais do que sabido que a natureza pode ser determinante num show ao vivo. O vento, por exemplo, tem o poder de, quando muito forte, estragar uma mixagem, fazendo com que o som "passeie" pela área a ser coberta pelos sistemas de PA. Em casos mais radicais, é preciso modificar o posicionamento de microfones ou até mesmo os modelos empregados.

Libarino conta que, na captação de instrumentos de brinquedo a céu aberto, as dificuldades causadas pelo vento são ainda maiores. Para ele, que vez ou outra precisa resolver problemas que ultrapassam a esfera tecnológica, algumas medidas podem salvar o show. "Quando percebo que o vento vai prejudicar a mixagem, começo a pensar em soluções. No caso deste espetáculo que estamos fazendo, quase sempre a primeira opção é substituir os microfones de voz por um SM58 normal, que é um pouco mais 'duro'. Com isso, conseguimos controlar um pouco as coisas", diz.

Para minimizar o risco de "choque" entre instrumentos de frequências similares, Libarino recorre ao bom e velho estéreo. Os overs de bateria, sempre captados por pares de microfones, são abertos no PA com algum grau de distanciamento. O xilofone e os glockenspiels, ambos captados por mics AKG C 460, também acompanham esta "imagem". "Os demais instrumentos são distribuídos no PA de acordo com a disposição no palco. Ou seja, guitarras e efeitos à esquerda, baixo no centro e teclados à direita."

Mesmo com tantos "pepinos" para resolver, quase sempre em tempo recorde, Libarino afirma que esta é a turnê mais importante de sua vida como profissional de áudio. Ele, que já trabalhou com diversos outros artistas, considera o atual momento inesquecível. "Não somente pelo trabalho que temos aqui, que não é pouco e é detalhadíssimo, mas por ver que a banda, quando está no palco tocando o repertório com essa roupagem, consegue agradar a crianças de três, quatro anos, e também a "crianças" de 60, 70. Esse é o tipo de coisa que não tem preço", encerra.



Gravando o DVD

O DVD da turnê Música de Brinquedo foi registrado no Auditório Ibirapuera, São Paulo, em abril de 2011. Na ocasião, de olho na melhor captação do material, Libarino também teve de promover substituições de microfones.

No bumbo da bateria, por exemplo, ele abriu mão do C 418 para usar um SM91, que mal pôde ser visto no palco devido ao seu formato praticamente plano. "Como se tratava de um registro, esta opção acabou sendo mais interessante, ou melhor, mais adequada", diz. No contratempo, que geralmente não é captado por nenhum microfone, ele lançou mão de um C 460. No surdo do instrumento, a opção foi por um SM98, da Shure.

As miniguitarras de John foram gravadas em estéreo. Um dos canais, que seguia via DI, foi registrado de forma clean, sem nenhum tipo de efeito. "Nunca é demais ter dois canais de guitarra numa gravação. Afinal de contas, na mixagem, com eles, é possível equilibrar timbres de características diferentes, que num somatório acabam oferecendo novas possibilidades ao produto final", destacou Libarino.

Tags: Pato Fu
 
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