Determinados assuntos nunca saem de moda. Nunca deixam de ser importantes. Tecnologias vêm e vão, mas sempre teremos que ouvir direito, com clareza e, acima de tudo, com confiabilidade a música que estamos fazendo, e, principalmente, mixando.
Nos clássicos anos 1980, popularizou-se o termo "caixa FLAT". Logo as antigas Yamaha NS10 viraram referência mundial em estúdios de gravação. Não vou me estender no assunto NS10. Todo estúdio profissional contava normalmente com três tipos de monitores: as caixas grandes (main) ou "caixas de cliente", que tinham uma resposta de freqüência vasta nas baixas freqüências; as NS10, teoricamente flat e mais confiáveis, pois na época eram as que tinham o som mais parecido com os sons dos ouvintes em casa e em carros; as Auratones, caixinhas pequenas de um falante só que simulavam radinhos de cabeceira ou algo do gênero.
Porém, com a diminuição dos estúdios grandes e a proliferação dos estúdios caseiros, quem montava estúdio em sua casa queria ter a monitoração igual à de um estúdio grande. Mas, por falta de dinheiro e espaço, a única caixa que ia parar no home studio, era a idosa NS10, famosa por ter uma resposta bem precária nas regiões graves. Resultado? Prossiga a leitura.
O que ocorre é que hoje se faz e se ouve música diferente do que se ouvia naquela época. A música pop de hoje tem muito mais brilho e, acima de tudo, muito mais freqüências graves e subgraves do que tinha antigamente. Vale enfatizar que quando digo mais grave não quero dizer mais quantidade de volume nos graves, e sim uma maior abrangência das freqüências baixas que antes não eram ouvidas em sistemas comuns, caseiros ou em carros.
Os sistemas de reprodução de som evoluíram. Parecia que o inverso do que tinha que acontecer estava acontecendo: na época em que todos em casa começaram a ouvir mais graves, todos nos estúdios (home studios) começaram a ouvir menos! Então, quem estava mixando, que em primeiro plano deveria ser quem ouvia melhor do que todos, acabava não ouvindo freqüências que então já começariam a ser ouvidas em casas e carros. Ou seja: passávamos horas mixando uma faixa no estúdio e na hora em que entrávamos no carro é que tínhamos a verdadeira noção do que estava acontecendo nas freqüências graves! Era como mixar sem ouvir, dirigir sem ver! Claro que estava errado. As NS10 estavam se tornando mais um daqueles paradigmas que todos seguiam e ninguém na verdade sabia porquê.
Costumo dizer que o resultado da nossa mix reflete inversamente os problemas da nossa monitoração. Ou seja, monitores com pouco grave vão nos fazer colocar mais grave na mixagem. Resultado: uma mix com mais grave do que o necessário. Outra: monitores perto demais um do outro vão nos fazer abrir o pan com mais radicalidade. Resultado: mix com imagem de estéreo muito mais aberta do que desejávamos, etc.
Quais as soluções para todos esses problemas? Acho que a maioria dos e-mails que recebo é de leitores perguntando quais monitores são os bons (ou certos!) para a mixagem. Por isso, acho que este tópico nunca vai sair de moda. Ou, melhor dizendo, de pauta, já que esta revista não é nem Nova nem Marie Claire (risos). E a minha resposta é sempre a mesma: se você vai ouvir, então escolha algo de que você goste. E não algo que "te disseram que é bom", mas que na verdade você acha o som um horror. Não tem nada pior do que mixar "compensando", tipo: "Não... Está muito médio aqui, mas em casa é que vai soar bem!". Isso sim é errado. Tem que soar bem ou ser coerente em qualquer lugar.
Lembre-se de um fator: hoje em dia, várias pessoas já ouvem música com subwoofer em seus home theaters e vários carros também já têm subs. Então, escolha algo que tenha uma boa resposta de graves ou um subwoofer para acompanhar. Pois tudo o que você não deseja é que seus ouvintes ouçam uma parte da mix que você não ouviu ao fazer.
Mixagens incríveis e coerentes para todos e menos trabalho nas masterizações!
Enrico De Paoli é engenheiro de mixagem de estúdio e PA. Último CD mixado: Vaidade, de Djavan. Atualmente mixa o PA desta turnê. Trabalho em andamento: CD independente de Alexandre Vaz.
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