Desde que surgiu a idéia de assinar a última página da MÚSICA & TECNOLOGIA, estive mais ocupado pensando em um nome para a coluna do que, efetivamente, sobre o que escrever. Então, como sempre, hoje já é dia 15 do mês, data limite para enviar os artigos para redação e eu não só nada escrevi, como nem sequer tenho um nome para a nossa nova coluna mensal. Ainda bem que hoje é feriado... Então, eu ganho mais um dia...
Acho que já sei um bom nome... "LUGAR DA VERDADE". Isso mesmo. São vários os motivos. É uma homenagem a um livro que estou lendo que se chama "Pedra da Luz", do escritor francês Christian Jacq. O "LUGAR DA VERDADE" era um povoado fechado no Egito onde trinta e dois artesãos viviam para construir as moradas eternas dos faraós. Um lugar cheio de mistérios onde, para ser admitido co-mo artesão, vários requisitos precisavam ser preenchidos. Entre eles: ser verdadeiro, amar o que se faz, dar absolutamente o melhor de si e não se preocupar com mais nada. No "LUGAR DA VERDADE" não existia o tal "bom suficiente"... Ou o trabalho era absolutamente divino, dando vida eterna às mumificações, admirado pelos deuses ou, simplesmente, não servia. Tudo isso soa um pouco familiar? Para mim sim. É simples.
A única maneira de acontecermos neste mercado é amando o que fazemos. Pois só assim faremos quali-dade por prazer, acima de tudo. Temos que ser verdadeiros, acreditando em nossos ouvidos. Sabendo pa-ra onde queremos ir e o que queremos escutar. O público, na verdade, não sabe o que quer escutar. Eles querem saber de nós. Conhecer nossos gostos. Viver nossa verdade. Fazemos o que queremos ouvir. Os que fazem o que o público quer ouvir não são admirados simplesmente porque o público sabe que "aquilo" não é de verdade. Nosso som tem que dar vida aos timbres. Os timbres darão vida ao arranjo. O arranjo dará vida à música. A música dará vida aos ouvintes. Costumo dizer que a música é realmente boa quando ela consegue mudar o estado de espírito de quem a ouve. Embarcando o ouvinte em uma viagem sem volta, a canção que leva o ouvinte de triste para feliz, de calmo para agitado, ou de agitado para calmo tem aquela magia buscada e alcançada no "LUGAR DA VERDADE".
Estaremos revivendo situações que, na VERDADE, são o que ouvimos. Passaremos por cima das regras, dos manuais, das teorias e acreditaremos, acima de tudo, nos nossos ouvidos. Discutiremos porque o óbvio, nem sempre é tão obvio assim, às vezes, soa como deveria soar. Falaremos sobre equipamentos. Su-as aplicações. E não nos contentaremos com nada de que não gostamos.
Aqui no "LUGAR DA VERDADE" vamos ouvir música como o consumidor ouve. Afinal de contas, qual foi a última vez que você pegou um CD da Madonna e ficou ouvindo se tinha muito reverb na caixa ou se a voz estava mais alta no primeiro refrão do que no segundo? E por que você passa a vida ouvindo isso nos seus discos?! Iremos mais longe... Então, quer dizer que ADAT não presta? Principalmente, os antigos, pretos, de 16 bits... Boa mesmo é a máquina analógica de duas polegadas e 24 canais... Ou, então, um Pro-Tools de vinte mil dólares... Quem não gosta? Quem sabe que "Live to Tell", da Madonna, foi gravada em um 8 canais caseiro daquela época? Que aquele CD da Alanis Morisette foi TODO feito em ADATs de 16 bits... Que "Eu te Devoro", do Djavan, estava em 24 canais e a base foi TODA editada em um Emu-DARWIN de 16 bits também e copiada em um determinado ponto na 24 canais analógica... Alguém aí ouve o ponto de edição? Não. Porque NA VERDADE, não dá pra ouvir. Até mês que vem.
Enrico De Paoli é engenheiro de áudio formado pela Grove School of Music e pelo Musicians Institute, na California. Seus créditos incluem Ray Charles, Djavan, entre outros. Acesse
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