Em meio às constantes e repetitivas polêmicas sobre a legalização, descriminalização, liberação e bla bla bla... da maconha, o Planet Hemp abriu um espaço para quem quer fazer música, mas muitas vezes é embarreirado pelas exigências das gravadoras e do mercado fonográfico em geral. Em 1997, quando começou a produção de seu primeiro disco solo Eu Tiro É Onda (Sony Music) em sua casa, Marcelo D2 não imaginava que em breve seria expulso de lá. Uma console Mackie, uma Digi 001 e um Mac G4 foram as primeiras engrenagens da Casa do Caralho (CDC), agora já ex-lar do vocalista do Planet Hemp.
Em quatro anos o estúdio colocou na rua quatro discos, somando 600 mil cópias vendidas (com Eu Tiro é Onda, de D2, e A Invasão do Sagaz Homem Fumaça, do Planet). Os outros dois são: Samba Esporte Fino, de Seu Jorge, e a coletânea Hip Hop Rio (Net Records), que deverão aumentar este número. A CDC vai dando ao underground carioca acesso a um trabalho de qualidade e sem frescura. "Alguns estúdios parecem saunas, clubes de fim de semana. Nada disso, grava em casa!", decreta Marcelo, que junto com o engenheiro de som do PH, Kléber França, procura agora entrar no mercado de gravação. "Se for para dar dinheiro para os outros, é melhor dar pra gente mesmo", afirma Kléber.
Estúdio sem Cara de Estúdio
Em um apêndice da casa onde funciona o estúdio, no bairro de Laranjeiras, Rio de Janeiro, Kléber França comanda o espaço que vem se tornando uma boa opção para artistas que querem fugir do ambiente frio e convencional da maioria dos estúdios comerciais. Kléber participou da montagem da CDC e está envolvido em praticamente todos os projetos feitos no local até agora. A parceria com a banda, que começou no final de 1995, está dando um resultado objetivo para quem quer ter um espaço em um mercado que diariamente engole músicos que não conseguem converter o seu talento em lucro para as gravadoras.
O último disco do Planet, A Invasão do Sagaz Homem Fumaça (Sony/Chaos), foi feito em meio a pausas para programas de tevê, jogos de videogame e grafites na casa. Sem contar gravações embaixo da escada, perto do banheiro, entre outras informalidades. "Na gravação do disco compramos uns colchões e ficou todo mundo morando aqui", ilustra Marcelo. O método de trabalho é radicalmente diferente de um estúdio convencional e isso pode ser notado pela própria estética da CDC. "A idéia foi fazer o estúdio não ficar com muita cara de estúdio. Então colocamos uma tevê na técnica, um bando de adesivos, foto de mulher pelada...", descreve o vocalista.
Com isso, a principal diferença apontada por Marcelo nas gravações foi mesmo o clima, que além dos artefatos de decoração, conta com detalhes que dão um toque mais humano ao espaço profissional. Na técnica, há espaço para a entrada da luz do sol. O acesso ao movimento da cidade é fácil, tendo em vista que bares, mercado, prédios, um hospital e muito trânsito ficam logo na descida da rua Mário Portela, a ladeira onde se localiza o estúdio.
Junto com Kléber, o morador único da CDC, Felipe Gama e Ricardo Mendes dão uma força para a infraestrutura do estúdio. Eles ajudam na sonoridade de rock'n'roll crua e antiga, que é a preferida da banda. Segundo Kléber, os integrantes do Planet escolheram e re-escolheram o setup até abrirem a carteira para comprá-lo. "Acho que nunca vai estar finalizado, mas pronto para trabalhar ele está", diz Kléber.
O planejamento acústico foi feito por Celso Junto, do Drum Studio, com indicações da banda, que ainda mantém na garagem mais aparelhos de estúdio e ainda aqueles usados na estrada. As próximas aquisições estão centradas nos valvulados, como o VoxBox Manley, com o qual esperam "aquecer o estúdio". Um dos destaques são os microfones. Muitos são usados em pares para capturar a ambiência da sala e dos instrumentos durante a gravação.Com uma boa captação, os músicos e Kléber já têm uma idéia do que podem alcançar com cada um deles.
Discos gravados no estúdio CDC
Longe da Pressão das Gravadoras
O pontapé inicial da empreitada da CDC não foi dado somente pelo disco de Marcelo D2. Para a gravação do último disco, o Planet trabalhou em casa e reinvestiu no estúdio a sobra do orçamento. A Invasão do Sagaz Homem Fumaça, mixado e masterizado em Los Angeles por Mario Caldato Jr, teve boa receptividade da crítica.
O próximo disco de D2 & Cia. deve ser gravado no final do ano e desta vez, segundo os planos da banda, será todo concluído na CDC. Isso só não pôde ser feito com A Invasão... porque a filha de Mario Caldato Jr estava prestes a nascer nos Estados Unidos. A experiência com o produtor foi importante para incentivar a banda a fazer o estúdio, tendo em vista que o trabalho dele com os Beastie Boys também possui um conteúdo de informalidade na produção. "O Mario foi uma cara que nos ensinou muito. Ele fez todos os discos dos Beastie Boys em casa", confirma Marcelo.
É fato que o estúdio está se estabelecendo como um pouso para bandas que tentam divulgar seu trabalho há bastante tempo e para outras que estão começando agora. Kléber França já trabalhou com o Acabou La Tequila, Dash e Squaws, de quem gravou várias demos e um disco. O baterista do Planet, Pedro, trabalha com a Inumanos, que está na coletânea Hip Hop Rio, um dos novos projetos feitos na casa. A coletânea é resultado da festa homônima que acontece semanalmente no bairro da Lapa, Rio. O disco demorou quatro anos para ser feito por se tratar de um projeto independente, que será vendido nas bancas de jornal.
Por enquanto, os trabalhos feitos na CDC se limitam a bandas de amigos e conhecidos do PH, mas a tendência é de que o empreendimento se insira mesmo no mercado, sem perder suas características principais. "Dentro deste mesmo mercado há espaço para músicos que queiram fazer som com essa característica; não caseiro em um sentido de mal gravado, mas um som mais sujo, mais underground, entre aspas", comenta Marcelo.
Com os chamados estúdios caseiros, o vocalista do Planet Hemp acredita que haverá mais espaço para quem quer se desvincular de pressões das gravadoras e da mídia, além das limitações que costumam ser impostas aos que têm um grau de compromisso maior com cifras de contratos e paradas de sucessos. "Lógico que todo mundo quer vender disco para caramba porque ninguém é burro, mas é bom que pelo menos seja possível controlar o som, o processo de criação. A maioria das bandas que vêm gravar aqui tem personalidade forte e está querendo sobreviver nesse mercado. Não adianta entrar em um estúdio gigantesco e botar no mercado para competir com Sandy & Jr, É o Tchan. A saída é fazer uma coisa mais caseira mesmo", acredita Marcelo.
Com uma proliferação constante de bandas de rock e hip hop no Rio, Kléber e D2 esperam atender bem à demanda. "A banda chega com a idéia de fazer aquele som e a gente tem que respeitar isso. Tem que dar valor para a ralação do cara para chegar ali e bancar do próprio bolso este trabalho", afirma o técnico do Planet.
A realização de discos, tanto por bandas novas quanto por aquelas que estão na ativa há algum tempo, muitas vezes acaba sujeita a equívocos que chegam a modificar a sonoridade. "Até as gravadoras maiores botam a banda para gravar em um estúdio que não tem muito a ver com o som", observa D2.
O rabisco ao lado da porta de entrada da casa, imitando uma placa de inauguração, indica a fundação do local como em 2000, mas a CDC já tem quatro anos. Para tão pouco tempo em ação, a variedade de projetos abrigada pela CDC já é grande. E o Planet Hemp pretende não só manter esta variedade, como incrementar o local com o seu próprio trabalho. "Agora os estúdios grandes são nossos concorrentes, a gente não pretende gravar nada fora daqui nunca mais", decreta Marcelo D2. O convite já está feito por Marcelo. "Quer gravar? Vai para a Casa do Caralho!!"
Relação de Equipamento - Estúdio CDC
Workstation
Pro Tools LE Digi 001
(Mac G4 400)
Gravadores
2 Alesis ADAT XT
Tascam 32 (2 canais 1/4")
Tascam32 (8 canais 1/4")
DAT Panasonic 3800
K7 TEAC
Consoles
Mackie 24:8
Behringer Eurorack MX 602A
Monitores
Genelec 1031A
Yamaha NS10
Amplificadores de referência
Samson Servo 260
Alesis RA 100
Pré-amps/ compressores/ DI
Bellari Studio Tube RP 520
2 Avalon VT 737 SP
Groove Tubes CL 15
2 Bellari ADB-3
Efeitos
Effectron II Deltalab ADM 1024
Roland Chorus-Echo RE 501
Digitech GSP-21
Boss Voice Transformer VT-1
Lexicon MPX-1
Microfones
2 AKG C-12 VR
2 Neumann U-87
2 Neumann KM 184
2 AKG 414 C B-ULS
2 Sennheiser 421
Sennheiser 609E
2 Shure SM-57
2 Shure SM-58
AKG D-112
Shure 55 SH
Shure 520 DX
Fones
5 AKG 141 Monitor
Samplers e sequencers
Akai MPC 2000
Roland TR-808 Rhythm Composer
Roland MC-303 Groove Box
Roland XP-60
Roland SP-808
Amplificadores de instrumentos
Marshall JCM 900 (guitarra)
Marshall JCM 900 1960
Mesa Boogie Dual Rectifier (guitarra)
Ampeg V4 (guitarra)
Ampeg SVT-400 TH (baixo)
Ampeg SVT 3 Pro (baixo)
Ampeg V2 (4 x 12")
Ampeg SVT (1 x 15")
Extras e instrumentos
6 toca-discos Technics MK2
Mixer Vestax PM5 OC Pro
Mixer Vestax PM5 OG Pro
Bateria Odery:
Bumbo 24", ton 12", floor ton 14", floor ton 16"
Baixos: Fender, Gibson, Rickenbacker
Guitarras: Gibson, Washburn, Epiphone (2 braços)
Pedais: Boss Delay (2), Distorções (4), Marshall, Mutron, Big Muff, Fuzz Face, Danelectro(2), Wah (Cry Baby, Vox, Auto Wah) e outros disponíveis, Line 6 Pod.